PAULO MACEDO

“A TRANSPARÊNCIA NA GESTÃO, A PAR DA QUALIDADE E SUSTENTABILIDADE, É DOS PILARES MAIS IMPORTANTES DO SNS”

 

Natural de Lisboa, onde nasceu a 14 de julho de 1963, Paulo Macedo é ministro da Saúde, mas continua a ser o mais desejado para a pasta das Finanças. Licenciado em Organização e Gestão de Empresas e com uma pós-graduação em Alta Direção de Empresas, foi docente universitario de Fiscalidade, durante 15 anos. Foi pela mão de Manuela Ferreira Leite que chegou à Direção-Geral dos Impostos (DGCI) em 2004, e pelo seu trabalho neste organismo, onde se manteve até 2007, é reconhecido como um dos maiores responsáveis pela modernização e informatização da máquina fiscal. Preocupado em cumprir os objetivos do memorando da troika, e em simultâneo melhorar os indicadores de saúde, o ministro orgulha-se de afirmar que “o Serviço Nacional de Saúde continua a dar resposta aos portugueses de forma equitativa, sem prejuízo da cobertura universal, em muitos casos com ganhos de saúde”, mesmo “num contexto de dificuldades, com o país a ser sujeito a uma intervenção externa, com diminuição de soberania orçamental que nos exige austeridade”, conclui.

No futuro, Paulo Macedo, o ministro mais popular e com mais credibilidade deste Executivo, afirma que vai continuar a concentrar-se “na redução da carga da doença, apostando fortemente na saúde preventiva, aproximando os cuidados de saúde dos cidadãos e reforçando os cuidados primários e continuados”. Por outro lado, prosseguirá “a reforma hospitalar e a reforma da política do medicamento” e reforçará o investimento “na excelência do conhecimento e na inovação”.

 

No mês em que faz  50 anos, quem é Paulo Macedo?

Sou alguém que acredita que, individualmente, devemos contribuir para fazer a diferença e que, coletivamente, somos capazes de fazer melhor. Um dia, se me perguntarem o que estava a fazer quando Portugal enfrentava a maior crise financeira, económica e social dos últimos 50 anos, poderei dizer que estava a servir o meu país, juntamente com uma equipa de dirigentes e profissionais de saúde de excelência, para quem o serviço público, numa área vital como esta, constituía fonte de motivação para nos superarmos. Para mim, a verdadeira felicidade é reflexa.

 

Dois anos após ter tomado posse como ministro da Saúde, que balanço faz?

Sou, por natureza, um inconformado… portanto, gostaria de ter feito mais. Todos sabemos que as reformas não se fazem de um dia para o outro, nem à pressa. Mas não posso deixar de assinalar que, num contexto de dificuldades, com o país a ser sujeito a uma intervenção externa, com diminuição de soberania orçamental que nos exige austeridade, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) continua a dar resposta aos portugueses de forma equitativa, sem prejuízo da cobertura universal, em muitos casos com ganhos de saúde. Diria que na Saúde, como noutras áreas, nestes dois anos, podemos não ter ganho ainda os próximos 20, mas de uma coisa estou certo: conseguimos evitar que se perdessem os próximos 20, bem como o que foi anteriormente conquistado.

 

O que destaca nestes dois anos?

Saliento que foi possível manter em funcionamento um sistema de saúde que estava em rutura, reforçámos a trajetória de reequilíbrio financeiro, condição necessária à sua sustentabilidade, mantendo uma resposta de qualidade às solicitações dos cidadãos que procuraram o SNS. Este é um ponto essencial. Face às dívidas acumuladas, às ameaças de cortes de fornecedores e ao aumento da procura dos serviços do SNS – devido à diminuição do rendimento disponível e das demais consequências negativas da crise –, conseguimos lançar um conjunto de reformas estruturais nas áreas do medicamento hospitalar, das carreiras médicas, da transparência, das tecnologias de informação, a par de medidas sem precedentes na acreditação de instituições de saúde e de combate à fraude e ao desperdício. Eu acredito no SNS e estes são aspetos cruciais para que este seja mais sustentável.

Um balanço positivo, portanto…Também tenho humildade para reconhecer deficiências e dificuldades inerentes à situação do Plano Nacional de Saúde. Há muito trabalho a fazer, mas é importante dizer aos portugueses que, apesar dos constrangimentos a que estamos sujeitos, a longevidade aumentou, a mortalidade prematura antes dos 70 anos baixou, o acesso ao medicamento cresceu, ao mesmo tempo que a despesa para o utente diminuiu como nunca tinha acontecido. As cirurgias aumentaram, ao mesmo tempo que a mediana do tempo de espera por uma intervenção cirúrgica baixou. Na verdade, para o valor mais baixo de sempre desde que se faz o acompanhamento e registo desses tempos. Isto é importante que se diga, pois não é só resultado do trabalho da João Crisóstomo [rua da sede do Ministério da Saúde], mas dos excelentes profissionais de saúde que temos.

 

A Saúde em Portugal estava a precisar de um bom gestor?

Estava a precisar de uma boa gestão, sem dúvida. Mas não era só disso. O SNS, apesar de todo o esforço que foi feito anteriormente, carecia de foco e de um conjunto de instrumentos adicionais indispensáveis à boa gestão dos dinheiros públicos. Uma gestão mais transparente, rigorosa e eficiente. A transparência na gestão, a par da qualidade e sustentabilidade, é dos pilares mais importantes do SNS que estamos a construir. As administrações dos hospitais, cujo desempenho tenho que destacar neste período de muitíssima maior exigência do que no passado, têm dado passos significativos numa gestão mais eficaz. Temos hoje gestores reconhecidos, ao nível do que de melhor se faz, no público e no privado, em Portugal e no estrangeiro.

 

Recebeu uma herança pesada da sua antecessora…

Herdámos indicadores que nos orgulham em diversas áreas da saúde, mas também herdámos uma dívida muito elevada, de cerca de três mil milhões de euros, e uma trajetória insustentável face à realidade do país. O desafio era exigente, o caminho da resposta era estreito, mas sabíamos que não podíamos hesitar nem manter erros que se perpetuavam há anos. Daí que se tenha dado prioridade ao pagamento de um valor significativo de dívidas para não ficarmos reféns dos fornecedores, da indústria farmacêutica em particular, e para assegurarmos a continuação do tratamento e os medicamentos a todos os portugueses. A Saúde beneficiou de uma discriminação orçamental positiva, pois apesar do contexto do constrangimento financeiro o Governo propôs e foi aprovado o maior orçamento de sempre para a Saúde em 2012.

 

Mas não teme que o SNS possa vir a sofrer com a redução da despesa pública? Não teme que os hospitais fiquem condicionados na resposta à população com a Lei dos Compromissos?

Apostamos numa política de redução dos custos da assistência para não termos de reduzir a própria assistência. Esta é uma questão em que não se reflete: quanto custaria ao SNS se os fornecedores, por não lhes pagarmos as dívidas, cortassem o fornecimento aos hospitais e aos centros de saúde? Quais seriam os custos em termos assistenciais e de coesão social, de um SNS não dar resposta à população, num tempo em que vivemos a maior crise das últimas décadas?

Por outro lado, a Lei dos Compromissos aplicada aos hospitais deve ter o devido enquadramento. Não pode ser uma lei cega, como o próprio Tribunal de Contas já o disse publicamente. (…)