NUNO MELO

“O CDS É UM BEM MAIOR, PATRIMÓNIO DA DEMOCRACIA QUE AJUDOU A FUNDAR E CONSOLIDAR”

Licenciado em Direito, advogado e consultor jurídico, o eurodeputado Nuno Melo é o atual líder do CDS. Empenhado em “falar para fora e construir o futuro”, Nuno Melo acredita que o CDS é um partido que “faz falta a Portugal”. A reconciliação do CDS com o seu passado passa, na sua opinião, pela “valorização do que realmente importa e pelo empenho das pessoas”. Por outro lado, o líder acredita que o CDS é hoje um partido “moderno, ágil e útil”, que representa o que nenhum outro consegue representar na Assembleia da República. “Nenhum partido que saiu da Assembleia da República era o que o CDS é em termos de votos, autarcas, lideranças de autarquias, lideranças em coligações, representação europeia, participação em governos regionais, envolvimento em algumas das mais relevantes instituições e associações deste país. A par das razões doutrinárias, estes são os grandes ativos com que contamos para um ciclo de reafirmação e crescimento”, concluiu Nuno Melo.Quanto à oposição que o CDS faz ao atual Governo de António Costa, o seu líder não tem dúvidas ao afirmar que esta é uma “oposição eficaz” e que muitas vezes “antecipa os factos políticos”, contudo, esta é, muitas vezes, condicionada pelas circunstâncias da “ausência na Assembleia da República”, sublinha Nuno Melo.Certo de que a governação de António Costa está a ser um “fracasso”, visível em “números recorde de funcionários públicos (741.698 já em níveis pré-troika), de dívida pública em valor absoluto (280.000 M€), de despesa pública anual (104.000 M€ para 2022) e claro está, para sustento de um Estado obeso, na carga fiscal sobre o trabalho (41,8%)”, o líder do CDS não acredita que o futuro de Costa passe por um “destino europeu de topo”, contudo, na sua opinião, o cenário de eleições antecipadas para Portugal talvez não fosse “mau”.No final do seu mandato, Nuno Melo quer deixar um CDS “renascido, de volta à Assembleia da República, no arco da governabilidade e determinante para o regime democrático”.

Como é que se reconcilia o CDS com o seu passado? 

Falando para fora, construindo o futuro, e não para dentro, num desperdício de ajustes de contas com o passado. Explicando que o CDS é um bem maior, património da democracia que ajudou a fundar e consolidar, um partido que integrou muitos governos e faz falta a Portugal. Aprendendo com os exemplos de Paulo Portas e de Manuel Monteiro, que me apoiaram no 29.º congresso que se realizou em 2 e 3 de abril, em Guimarães, superando divergências a pensar no bem maior que é o partido e dando o exemplo quando apelaram ao esforço e à mobilização para superação dos tempos difíceis. 

Escutando o pedido feito pelo Professor Adriano Moreira durante o 30.º Congresso Estatutário do partido, realizado pouco depois em Aveiro, quando do alto dos seus quase 100 anos disse: “não desistam, acreditem sempre”. A reconciliação do CDS com o seu passado passa pela valorização do que realmente importa, e pelo empenho das pessoas e extraordinários quadros e estruturas que sempre foram o nosso maior património, reunidos na crença de que conseguiremos dar a volta às atuais circunstâncias. 

Que CDS temos hoje? 

Um partido que não se resume ao dia 30 de janeiro de 2022 e que, apesar de ter perdido o seu grupo parlamentar, teve muitos mais votos do que outros partidos que elegeram um deputado. 

Um partido que governa sozinho seis autarquias, no continente, Açores e Madeira – Ponte de Lima, Vale de Cambra, Albergaria-a-Velha, Oliveira do Bairro, Velas e Santana –, e mais de 40 autarquias em coligação com o PSD. Um partido que tem uma delegação no Parlamento Europeu, coisa que alguns partidos que estão na Assembleia da República não têm e que integra os governos de ambas as Regiões Autónomas. Um partido de quadros reconhecidos em todas as áreas setoriais, profundamente entrosado com a sociedade e as instituições mais relevantes, mas também com estruturas locais repartidas por todo o território nacional. Um partido que se mantém referencial do ponto de vista político, democrata-cristão, humanista e personalista, aberto a correntes liberais e conservadoras. Um partido que abriu as portas a independentes que, a par de quadros militantes, ajudam hoje a identificar problemas e a conceber soluções. Um partido moderno, ágil e útil. Um partido que representa o que nenhum outro consegue substituir na Assembleia da República. 

Foi uma herança pesada a que lhe deixaram? 

Leve não foi certamente. Mesmo assim, importante é que nos concentremos nas possibilidades, e não nas dificuldades. Perdendo o Grupo Parlamentar na Assembleia da República, o CDS perdeu a maior ferramenta política, grande parte da exposição mediática e os recursos financeiros. Mas aqui chegados, importante é que sejamos capazes de aprender com os erros. O CDS nunca foi talhado para as batalhas fáceis. A que temos pela frente será a maior de todas e exigirá muito esforço e superações. Acredito que entregaremos o partido em melhor estado do que aquele em que o recebemos. Já se verá. 

Nenhum partido que deixou de estar representado no Parlamento conseguiu voltar. O que pretende fazer para voltar a colocar o CDS representado no Parlamento? 

Nenhum partido que saiu da Assembleia da República era o que o CDS é em termos de votos, autarcas, lideranças de autarquias, lideranças em coligações, representação europeia, participação em governos regionais, envolvimento em algumas das mais relevantes instituições e associações deste país. A par das razões doutrinárias, estes são os grandes ativos com que contamos para um ciclo de reafirmação e crescimento. 

O que sucedeu em 30 de janeiro foi uma circunstância conjuntural. Importante é que consigamos perceber muito bem os erros e aprender com eles. 

 

Quais são as principais áreas de interesse em que também vai apostar, nos próximos anos, para revitalizar o CDS? Que ideias gostaria que os eleitores associassem ao CDS? Como captar de novo o eleitorado natural do CDS? 

O CDS vai voltar a ser nítido nas causas diferenciadoras, antigas e novas. Quando o CDS era tido como o partido dos contribuintes, dos pensionistas, dos ex-combatentes, dos agricultores, da segurança ou da moralização e fiscalização do recurso a subsídios, não nos agarrávamos a nichos, dávamos voz a causas. Outras há que surgiram e precisam da marca do CDS, da transição digital, aos novos paradigmas energéticos, da economia azul às preocupações com os recursos aquíferos. 

Um certo esbatimento, no sentido de um posicionamento mais generalista, que não é culpa de ninguém, por ter sido fruto das circunstâncias, acabou por permitir que outros partidos recentes chamassem a si, como se fossem novas, causas que o CDS levara para o debate político há anos e sempre foram marcas de água nossas. 

Temos de reocupar o espaço político que sempre nos coube e ao mesmo tempo de perceber que o mundo evoluiu, há outras agendas políticas, as preocupações das novas gerações alteraram-se e quem não se souber adaptar corre o risco de perder relevância. Atente-se a reconfiguração que mudou o mapa político-partidário de muitos países europeus.  

Tendo isto em conta, o CDS vai atualizar o seu programa político, formatando-o para as exigências do século XXI. Miguel Morais Leitão e António Lobo Xavier apresentarão dentro de meses as linhas gerais desse programa, que serão discutidas e aprovadas em Conselho Nacional, como resultado da reflexão de um conjunto de personalidades do CDS, de diferentes gerações. Noutro âmbito, o último Congresso Estatuário aprovou a criação de um gabinete estratégico e programático constituído por diferentes grupos setoriais de que fazem parte militantes e independentes que, entre outras coisas, têm a incumbência de acompanhar problemas e sugerir soluções que o CDS poderá apresentar como propostas políticas. 

Não pretendo que o CDS seja um megafone de protesto, assente num homem só. Quero o partido a mostrar-se útil porque, a par de liderança, conta com rostos que Portugal conhece de norte a sul pela capacidade e que são escutados pela sua credibilidade. 

Não pretendo que o CDS seja reduzido a uma ideia sobre economia apenas. Quero o partido a lutar por um mercado saudável, mas por causa das pessoas, apostado na distribuição de riqueza, na valorização do mérito, na eficácia do elevador social, porque não nascemos todos com as mesmas oportunidades. 

Temos de saber falar para os portugueses todos: para profissionais de saúde desconsiderados e mal pagos que todos os dias se sacrificam para manter o SNS falido a funcionar; para os milhares de professores que ensinam sem estabilidade na profissão, igualmente desconsiderados e mal pagos, tantas vezes longe de casa e sem qualquer autoridade nas escolas e universidades; para os jovens, porque é difícil ser jovem em Portugal, mesmo se qualificado, no mercado de trabalho – repare-se que 77% dos jovens portugueses recebem salários entre 414€ e 1158€; para as mulheres, que convivem com uma diferença salarial para os mesmos cargos desempenhados por homens de cerca de 11%; para aqueles que hoje não conseguem comprar ou arrendar casas nas cidades onde nasceram e trabalham porque o custo por metro quadrado ou o valor das rendas deixou de ser compatível com a maioria dos salários. 

A classe média está a diminuir em número, e o seu rendimento disponível, mutilado por impostos absurdos, tornou-se genericamente ridículo. Os socialismos transformaram dependências em votos, adensando ciclos de pobreza. O CDS tem de saber falar para uma classe média assim vergastada. Ser empresário em Portugal é um pesadelo pela burocracia e valor exagerado de IRC e os proprietários estão transformados em arrendatários do Estado, tantos os encargos que suportam. O CDS tem de saber falar para quem teima em criar riqueza e postos de trabalho. Temos de compreender tudo isto muito bem e de lutar por uma sociedade muito melhor para recuperarmos nas urnas, apesar de a batalha ser absolutamente desigual. 

O que falta ao CDS para voltar a ter o voto jovem? Novas ideias como as que foram, por exemplo, apresentadas nas últimas eleições pela Iniciativa Liberal? 

As ideias da IL não tiveram nada de novo. Limitaram-se a crescer centrando todo o discurso em ideias bem velhas de liberalismo económico e de combate ao peso do Estado – o CDS fala disso há anos –, mas beneficiando de uma campanha de marketing político muito eficaz, que outdoors criativos potenciaram. O resultado da IL é, na origem, uma vitória da comunicação e quase nada de protagonistas políticos, que a maior parte das pessoas nem sequer conheciam. 

Para o que importa ao CDS, acho que os jovens de hoje são muito mais pragmáticos do que os jovens da minha geração, a seu tempo muito mais ideológica. Querem respostas concretas, para problemas concretos. Discursos inflamados colhem cada vez menos. Os jovens de hoje nasceram depois do 25 de Abril, a loucura do PREC não lhes diz nada, muitos desconhecem a importância do 25 de Novembro, nunca tiveram de mostrar o bilhete de identidade para passar fronteiras que deixaram de existir fisicamente e a União Europeia é um dado adquirido. 

Compreensivelmente, querem perceber o que defendem os partidos para que consigam oportunidades de emprego nas suas áreas de licenciatura ou mestrado, para que os salários não sejam absurdamente baixos, para que arrendar ou comprar casa nas cidades onde nasceram não seja uma impossibilidade, para que o projeto europeu tenha futuro e lhes continue a garantir o privilégio de serem cidadãos de uma União de mais de 440 milhões de pessoas, onde se circula, estuda, trabalha e vive livremente em muitos países.  

Não quero o CDS a viver do passado apenas, mesmo se temos orgulho nesse passado. Quero o CDS apostado no futuro, como partido útil, ágil, que aposta e valoriza as novas gerações e dá respostas para os seus problemas. 

Que oposição faz, hoje, o CDS? 

Uma oposição eficaz, que muitas vezes antecipa os factos políticos, embora condicionada pelas circunstâncias da ausência na Assembleia da República. 

Foi o CDS que, na sequência das “Conversas do Caldas”, que são debates temáticos sobre temas relevantes, no caso sobre inflação e o aumento do custo de vida, sugeriu pela primeira vez a necessidade de reduzir o IVA de bens essenciais sem necessidade de autorização da Comissão Europeia na sequência de uma diretiva aprovada em abril. A proposta acabou copiada por outros partidos na discussão do Orçamento do Estado. 

Foi o CDS que pela primeira vez sugeriu a descida do ISP, para compensar o aumento do IVA nos produtos petrolíferos. A medida acabou adotada pelo Governo, como anotado por alguma imprensa.  

Foi o CDS que pediu a intervenção de Bruxelas na avaliação do Banco de Fomento, chamado a aplicar milhões do PRR apesar de problemas funcionais e na estrutura dirigente, que tomou posição contra a ministra da Agricultura pela inexistência no setor e discriminação da CAP, que primeiro reagiu à desautorização do ministro das Infraestruturas por parte do primeiro-ministro no episódio caricato do anúncio e cancelamento da construção de dois aeroportos, para dar alguns exemplos apenas. 

Para o que importa, tenho por certo que, usando e abusando da maioria absoluta de que dispõe, António Costa transformou a Assembleia da República num “parlamento mudo”, prisioneira de si mesma, limitada na sua ação e impedida de funcionar como um órgão verdadeiramente fiscalizador da atividade governativa. Neste cenário, a oposição feita fora da Assembleia da República assume muito maior relevo e nessa medida a importância do trabalho que o CDS vem desenvolvendo, apesar de tudo. 

Que leitura faz do desempenho do governo de António Costa desde que tomou posse, com maioria absoluta? 

No plano geral são os resultados que mostram o fracasso da governação. Desde 2015 podem medir-se em números recorde de funcionários públicos (741,288 já em níveis pré-troika), de dívida pública em valor absoluto (279.000 M€), de despesa pública anual (104.000 M€ para 2022) e claro está, para sustento de um Estado obeso, na carga fiscal maior de sempre (35,8% do PIB). 

No plano setorial é o que se vê: 

A agricultura, beneficiária da maior parcela do orçamento comunitário, tem em Portugal uma ministra que discrimina em função dos apoios ao PS, sem peso nem capacidade. 

Nas infraestruturas, o ministro Pedro Nuno Santos conseguiu decidir sozinho acerca de dois novos aeroportos, sem ouvir o primeiro-ministro, sem discutir a solução em conselho de ministros, sem ouvir as oposições, sem informar o Presidente da República, por recriação própria e sem conhecimentos técnicos, mantendo-se depois no cargo apesar de humilhado e desautorizado por António Costa, receoso por seu lado do peso do ministro dentro do partido e do grupo parlamentar. Passamos a ter no Governo uma coligação de duas fações antagónicas do PS. 

O SNS caminha para a falência, em resultado de opções da ministra Marta Temido que acreditava que os problemas da Saúde se resolviam com ideologia e a escutar a Internacional, apoiada pelo primeiro-ministro. 

Nos incêndios, o Governo falhou em todos os níveis. Não realizou reformas prometidas, sem aprender com os erros que vitimaram mais de 100 pessoas e destruíram milhares de hectares em 2017, deixou Portugal de fora da Rede Europeia de Proteção Civil, não preparou a época crítica de fogos em cada outono e inverno, desinvestiu na limpeza da floresta, na abertura de corta-fogos, na replantação de árvores e plantas adequadas ao território e na compra de equipamento de prevenção e combate, permitiu contratos sem sentido com familiares de governantes ou autarcas, de que o escândalo das golas inflamáveis, num processo com arguidos constituídos, é só exemplo, mantém múltiplas entidades com competências sobrepostas, e quer complicar ainda mais a estrutura dos comandos territoriais, contra a opinião das corporações de bombeiros. 

Na Educação, a proposta de que todos os licenciados pós-Bolonha, sem qualquer formação pedagógica, possam vir a dar aulas, ou o anúncio de que aulas de Português e Inglês poderão ser dadas com candidatos com patamarmínimo de formação, revelam em relação às novas gerações o socialismo tal qual é: a nivelar por baixo, com mínimos de exigência, formando aparências a pensar em estatísticas, em vez de garantir ferramentas a pensar na competência. 

Na Justiça e na Segurança, o Governo quer retirar a EUROPOL e a INTERPOL da esfera da PJ, para as colocar sob alçada do Sistema de Segurança Interna, que depende diretamente do primeiro-ministro, com um secretário-geral equiparado a secretário de Estado, violando regras básicas do Estado de Direito e do Princípio da Separação de Poderes e enfraquecendo a independência da Justiça. Recordaria que em Portugal já aconteceu um primeiro-ministro ser alvo da Justiça – José Sócrates –, há ex-membros de Governo que estão constituídos arguidos e sob investigação da OLAF, organismo europeu de luta contra a fraude, são conhecidos negócios celebrados com familiares de governantes, em 2021 os casos de corrupção aumentaram 42% e o país apenas aplicou 3 das 15 recomendações da GRECO para luta contra a fraude. 

Em matéria de Economia e Finanças, é imoral que o Estado esteja a arrecadar todos os dias ganhos milionários à conta da inflação e do sacrifício das famílias portuguesas. Até maio foram mais de 5 mil milhões de lucros excessivos. Mais haveria, mas para balanço de uma governação falhada não parece pouco. 

Considera que a pasta da Saúde é uma prioridade para António Costa? Que leitura faz da escolha do novo ministro da Saúde, do papel do CEO do SNS e da escolha de Fernando Araújo para este cargo? 

Prioridade será para qualquer primeiro-ministro. O problema está na incapacidade do Governo para lidar com a enormidade da tarefa. Tendo a dar o benefício da dúvida a quem inicia funções de responsabilidade, casos do Manuel Pizarro, ou de Fernando Araújo. Mesmo assim, nenhum nome significará coisa nenhuma, se não se alterarem as políticas e a visão carregada de ideologia que trouxeram o caos aos hospitais. 

Este Governo teve uma ministra do SNS, mais do que uma ministra da Saúde. E aqui chegados, o SNS caminha para a falência, enquanto o governo gasta 11 milhões de euros em 4 dias de Web Summit e 3188 milhões na TAP,que reverteu para o Estado por pura ideologia. 

O Governo desmantelou parcerias do SNS com privados, numa decisão errada que transformou hospitais de excelência em hospitais com muitos problemas. Há grávidas em risco, porque não há médicos obstetras nos hospitais, há doentes que morrem, porque as urgências encerram, há doentes que não são salvos, porque esperam anos por primeiras consultas que poderiam fazer a diferença nos tratamentos possíveis. 

Há muito menos pessoas com médico de família do que em 2015. Recorde-se que, em 2015, António Costa prometia médicos de família para todos os portugueses em 2017. Hoje, há 1,3 milhões de portugueses sem médico de família, muitos mais do que em 2015. 

Tivemos uma diretora-geral da Saúde a aconselhar os portugueses a não comerem bacalhau à Brás, nem adoecerem no verão, enquanto uma ministra da Saúde dizia que os problemas radicavam em decisões dos anos 80 do século passado, esquecendo pelo caminho tantos governos socialistas de Mário Soares, António Guterres, José Sócrates e António Costa, e através deles, anos de decisões tomadas e não tomadas no setor. 

Tenho por certo que os problemas do SNS não se resolvem com ideologia. Os problemas do SNS resolvem-se com investimento em gestão, meios técnicos e humanos, valorização do mérito e do esforço dos profissionais de saúde, complementaridade entre setores público, privado e social. 

Que SNS podemos esperar no futuro? 

Teremos de esperar para perceber o projeto que os novos titulares no ministério defendem. Sinceramente não tenho as expetativas em alta. 

Considera a sustentabilidade um assunto de esquerda? 

Ponderado que no final de cada ciclo de governação os socialismos entregaram invariavelmente o país intervencionado ou em grandes dificuldades, e os partidos de centro-direita foram quase sempre chamados para pagarem as contas e arrumar a casa, parece evidente que não. 

Atente-se nisto: em Portugal o número de dependentes do Estado aumentou de 32% em 1980, para 51% em 2020, 16% dos portugueses pagam 80% dos impostos e um terço da população paga os restantes 20%. 

A realidade ajuda a perceber como o socialismo encontra na apropriação do esforço dos outros, através de impostosabsurdos, a ferramenta política que permite engrossar a fileira dos que precisam do Estado, perpetuando ciclos de dependência fiéis, porque dão votos. 

Numa democracia que viveu a maior parte do tempo com governos socialistas, a circunstância ajuda a perceber o estado da Nação, mais pobre no fim de cada um dos ciclos em que lhes entregou o destino. Significa que a sustentabilidade nunca foi uma preocupação das esquerdas. 

Relativamente à questão do novo aeroporto, qual a sua posição? 

Convém recordar que esta discussão tem 53 anos. Há sete anos o assunto esteve encerrado e decidido, quando um protocolo foi assinado no último governo PSD/CDS por Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Aconteceu depois de muitas discussões e estudos, tendo-se optado pela fórmula Portela+1, com obras de extensão na Portela e um aeroporto no Montijo. Foi o Governo socialista que reverteu esta decisão, impedindo que pudéssemos ter um novo aeroporto a entrar em funcionamento em 2023. Significa que se perderam sete anos, com um custo que também se pode medir pelo que está a acontecer no aeroporto da Portela. 

Portugal não é um país rico. Mas a diferença, agora, entre fazer o que foi decidido há 7 anos, ou optar-se por outro novo aeroporto qualquer é a seguinte: O novo aeroporto no Montijo, com a extensão na Portela, poderá ser feito em 2027. Um outro novo aeroporto de raiz, só para 2036, correndo bem. 

Ponderando custos, em valores de 2017, os custos da expansão da Portela eram de 300 milhões de euros e os custos do aeroporto no Montijo eram de 650 milhões de euros, num total de 950 milhões de euros. Já os custos de um outro novo aeroporto de raiz, igualmente em valores de 2017, seriam de 7,3 mil milhões de euros. 

A solução do anterior governo da coligação PSD/CDS tem um estudo de impacto ambiental positivo, com necessidade dos chamados remédios. Um outro novo aeroporto não tem sequer o pedido do estudo de impacto ambiental. 

No caso da solução Portela mais Montijo há já acessos rápidos e muito menos custosos. No caso de outro novo aeroporto será talvez preciso construir uma nova ponte ferroviária que não poderá ser paga pelo concessionário, logo, teria de ser paga também com os impostos dos contribuintes. 

Finalmente, dar novo destino aos terrenos na Portela que foram expropriados para efeitos do aeroporto implicaria com grande probabilidade o pagamento de indemnizações às famílias das pessoas que foram expropriadas, certamente muito altas. São tudo razões ponderosas que neste momento têm de ser tidas em conta. 

Que comentário faz ao pacote de medidas apresentado, recentemente, pelo governo para apoiar as famílias? É um pacote de medidas justo? 

As propostas do Governo são uma enorme desilusão e representam o socialismo no seu pior, porque o Governo pôs o Estado à frente dos portugueses e a cobrança de impostos à frente das famílias. Só isso justifica que o Governo tenha demorado seis meses a reagir, desde que em abril o CDS reclamou várias medidas possíveis, que quantificou. 

O anúncio da redução do IVA sobre a eletricidade para 6% é uma fraude, uma vez que o IVA de 23% sobre a eletricidade, que abrange a grande maioria dos consumidores portugueses, vai manter-se na taxa máxima de 23%, ao contrário do que está a acontecer nos outros países da UE. Aliás, o Governo deixa de fora milhões de portugueses, principalmente do interior, muitas vezes os mais pobres, que utilizam gás de botija, não vão ter qualquer apoio e não podem mudar para o mercado regulado. 

A decisão do Governo de não atualizar os escalões de IRS significa que as famílias portuguesas vão ser sujeitas a um aumento brutal de IRS este ano, a pagar em 2023. 

A decisão do Governo de não aplicar a taxa 0% nos produtos alimentares essenciais, como o CDS propôs, significa que as famílias portuguesas, principalmente as mais vulneráveis, vão continuar a suportar a inflação brutal para já de 15% sobre os bens alimentares básicos. 

Relativamente às pensões, o primeiro-ministro tinha garantido que em 2023 haveria “um aumento histórico”. Percebe-se agora que a promessa era totalmente falsa. O que o Governo entregará em 2022 não é mais do que um subsídio. Um aumento seria permanente, o que não é o caso. Este valor não contará para quaisquer aumentos futuros. 

Acresce que não foi decidido nenhum apoio ao setor social. As instituições sociais suportam um brutal aumento da inflação, acima da inflação total, que coloca em risco o seu papel ainda mais relevante em tempos de crise. 

Para o que importa, o que sobrou em propaganda, faltou em sensibilidade social e em medidas capazes de fazerem real diferença em tempos particularmente difíceis, que tendem a acentuar-se. 

Na sua opinião, as escolhas que António Costa fez para o seu governo demonstram que quer e está mais perto de Bruxelas? 

Que António Costa sonhe com um destino europeu de topo, há quem diga que sim. Que isso seja possível, duvido. Que pudesse deixar o Governo sem que isso implicasse uma crise política e a realização de eleições antecipadas, o Presidente da República já esclareceu; teríamos eleições antecipadas. Bem vistas as coisas, talvez não fosse mau. 

Que marca quer deixar no CDS? 

A marca de um partido renascido, de volta à Assembleia da República, no arco da governabilidade e determinante para o regime democrático. O CDS tem passado, luta com convicção no presente e acredito que ainda terá muito futuro. 

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