“TEMOS UM GOVERNO QUE ASSUMIU A VALORIZAÇÃO DO TERRITÓRIO, A DINAMIZAÇÃO DO INTERIOR E A COESÃO TERRITORIAL COMO PRIORIDADES DA AÇÃO GOVERNATIVA”
Encarando a política como uma forma de “fazer algo positivo”, especialmente “pela terra”, João Paulo Catarino, secretário de Estado da Valorização do Interior destaca o “efeito transformador” que a política pode representar. Expressando a convicção de que nunca houve, como neste Executivo, “esta vontade política para diminuir desigualdades e projetar um território que, embora tendo muito potencial, tem sido por vezes esquecido”, João Paulo Catarino afirma, que a “descentralização representa esse novo paradigma político”. É inegável que os territórios do interior enfrentam um grave problema de despovoamento e reclamam soluções políticas, mas as medidas que este Governo tem procurado implementar desde o início do seu mandato “já produziram efeitos concretos que podem ser vistos e sentidos por aqueles que vivem, estudam, trabalham, visitam e investem no interior”, sublinha. Quanto à verba do Orçamento do Estado, na opinião do secretário de Estado vai “ao encontro das metas que estão definidas para este último ano de mandato”. João Paulo Catarino espera que o trabalho que vai desenvolver possa ser “reconhecido pelos resultados que conseguiu e conseguirá ainda produzir para as populações e para os territórios do interior”, conclui.
O que o levou a enveredar por uma carreira política? O que o fascina na política?
A minha participação política surge com a convicção de que poderia fazer algo de positivo pela minha terra. Aquilo que sempre me fascinou nos cargos públicos é o efeito transformador que a política pode representar. Mais importante do que dispor dos meios para implementar as medidas que nos parecem ser as mais adequadas em cada momento, é a possibilidade de efetivamente poder ver os resultados dessas políticas e poder sentir os efeitos que tiveram no quotidiano dos cidadãos.
Como recebeu a notícia de que iria integrar este Governo?
Com muito agrado, naturalmente, e com a convicção de que nunca houve como agora esta vontade política para diminuir desigualdades e projetar um território que, embora tendo muito potencial, tem sido por vezes esquecido. Temos um Governo que assumiu a valorização do território, a dinamização do interior e a coesão territorial como prioridades da ação governativa. Um Governo que olha para as autarquias locais como parceiras, com a ambição de as dotar de competências e condições que nunca tiveram. A descentralização representa esse novo paradigma político. Poder dar o meu contributo e fazer parte de um Governo que assume a valorização do interior como um desígnio e uma causa nacional, no contexto da estratégia e visão que o Governo tem procurado prosseguir para esta área, é algo que me motiva bastante e é sem dúvida motivo de orgulho.
Dado o seu “conhecimento de causa”, por viver numa aldeia e sofrer, diretamente, com os efeitos da desertificação, que diferença poderá fazer num cargo como este?
Claro que o facto de ser natural e residir num concelho do interior me dá um conhecimento não só sobre os problemas e limitações com que as pessoas se confrontam diariamente como também das suas vantagens, quer do ponto de vista da qualidade de vida, quer em termos do conhecimento e consciência das suas potencialidades. O que ajuda a melhor enquadrar e ponderar as diferentes medidas de ação política definidas para estes territórios, nomeadamente a sua aplicabilidade e adequabilidade. É inegável que os territórios do interior enfrentam um grave problema de despovoamento e reclamam soluções políticas, medidas efetivas, que este Governo tem procurado implementar desde o início do seu mandato e que já produziram efeitos concretos que podem ser vistos e sentidos por aqueles que vivem, estudam, trabalham, visitam e investem no interior. Ao reduzir o número mínimo de alunos por turma, garantimos a manutenção de 400 turmas com menos de 21 alunos; das 17 novas Lojas do Cidadão abertas durante esta legislatura, 11 estão localizadas em territórios do interior, garantindo serviços de proximidade e qualidade a estas populações, assim como os Espaços Cidadão que estamos a abrir em pequenas localidades; lançámos o Cadastro Simplificado do território em 10 municípios-piloto, pretendendo agora alargar o sistema a todo o território, com um regime de gratuitidade alargado; lançámos uma linha de apoio à valorização turística do interior, no âmbito do Programa Valorizar, que conta já com 211 candidaturas aprovadas só no interior, o que corresponde a um investimento de 67,8 milhões de euros; lançámos o Programa Revive, que tem por objetivo promover a requalificação e subsequente aproveitamento turístico de um conjunto de imóveis do Estado, sendo que dos 10 concursos já lançados, sete dizem respeito a imóveis localizados em territórios do interior, e estes são só alguns exemplos das medidas postas em prática por este Governo, que já produziram efeitos importantes e visíveis no território. O conhecimento que tenho relativamente à realidade destes territórios permite-me exercer as funções para as quais fui convidado de forma esclarecida e consciente, mas a solução para os territórios do interior tem de ser, como o nosso primeiro-ministro António Costa tem defendido, e bem, uma questão nacional. E não posso deixar de me congratular por termos um primeiro-ministro que, sendo lisboeta, tem a noção perfeita de como os problemas do interior podem ser ultrapassados. Não podemos encarar a questão da valorização do interior como se se tratasse apenas de um conjunto de reivindicações de uma parte da população que vive a uns quantos quilómetros do mar. A questão tem de ser encarada como uma causa nacional, uma questão de justiça para com as pessoas e os territórios que durante longos anos não foram devidamente considerados nos programas de Governo, mas também uma questão de aproveitamento das potencialidades de uma parte muito significativa do nosso território que não está a ser explorada e aproveitada em todo o seu potencial e que poderá dar um contributo muito significativo para a economia nacional.
Considera esta pasta uma continuidade da Unidade de Missão?
A Secretaria de Estado da Valorização do Interior mantém, necessariamente, os propósitos e as preocupações que estiveram na génese da Unidade de Missão para a Valorização do Interior, procurando ir mais além. Uma Secretaria de Estado tem ao seu dispor ainda mais instrumentos e tem maior visibilidade e influência que uma Unidade de Missão: tem competências em matéria de definição e concretização de medidas territoriais de valorização e de desenvolvimento económico e social dos territórios do interior; em assuntos de investimento relativamente a estes territórios, designadamente no acompanhamento e execução de investimentos nacionais e estrangeiros; de condução de políticas de desenvolvimento dirigidas ao crescimento da economia, que promovam o ordenamento do território, a sustentabilidade e a competitividade dos sistemas agroflorestais e o desenvolvimento rural do interior, num trabalho que é necessariamente concertado e transversal a todas as áreas de governação. Irá conduzir e acompanhar a execução do Programa de Valorização do Interior e do Programa de Revitalização do Pinhal Interior, e trabalhar em matéria de cooperação transfronteiriça, procurando potenciar a posição privilegiada que o interior de Portugal continental tem no contexto ibérico, como meio de afirmação destas regiões, procurando que se assumam como novas centralidades de um grande mercado ibérico com mais de 60 milhões de consumidores.
Quais são as principais preocupações do ministério a que está afeto?
Integrar a Secretaria de Estado da Valorização do Interior na tutela do ministro Adjunto e da Economia faz parte da solução que o Governo preconizou para os problemas com que estes territórios se confrontam. Acreditamos que o desenvolvimento do interior se faz por via da economia e do emprego. A valorização do interior é alcançável com atividade económica, com investimento que impulsione o tecido empresarial destes territórios, gerando riqueza e criando emprego, que permita, por sua vez, a fixação de pessoas. O facto de o ministro Pedro Siza Vieira continuar também como ministro Adjunto permite manter a possibilidade de trabalhar de forma transversal com todas as áreas governativas. A Cimeira Luso-Espanhola, realizada a 21 de novembro, em Valladolid, é bem demonstrativa do empenho do Governo em reforçar a cooperação transfronteiriça como parte da estratégia para o desenvolvimento das nossas regiões de fronteira. Da cimeira resultou também a criação de um grupo de trabalho que já está no terreno. Há pouco mais de uma semana, realizámos a primeira reunião do grupo de trabalho Portugal-Espanha que está a definir a estratégia comum de desenvolvimento das regiões de fronteira, liderado a nível nacional pelo professor Anselmo de Castro, coordenador do Grupo de Estudos em Território e Inovação da Universidade de Aveiro, e do lado espanhol por Isaura Leal Fernández, comissária do Governo espanhol para os Desafios Demográficos, e por Ignacio Molina de la Torre, seu diretor.
Considera que a criação da nova Secretaria de Estado da Valorização do Interior se insere na estratégia de António Costa para ir buscar votos ao interior? Teremos eleições no próximo ano…
A estratégia do primeiro-ministro e de todo o Governo relativamente ao interior não é uma questão eleitoral. A Valorização do Território é um dos eixos de ação do Programa do Governo, inscrito de forma muito clara neste documento desde o início do mandato, em 2015, contendo, entre várias outras medidas, a criação de uma unidade de missão para a valorização do interior, o que veio a acontecer logo no início do mandato com a aprovação da Lei Orgânica do XXI Governo Constitucional. O tema consta igualmente e com a mesma relevância no Programa Nacional de Reformas, onde se assume a coesão territorial como crucial para a competitividade e para a qualificação do território. Portanto, não começámos agora. Resumir o compromisso e todo o trabalho já realizado por este Governo a uma questão eleitoral parece-me muito injusto.
Quais são, na sua opinião, as expectativas face a esta nova estrutura governamental?
A maior expectativa é efetivamente continuar a implementar medidas que sejam capazes de inverter esta tendência de perda de capital humano a que os territórios do interior têm estado votados; criar condições nestes territórios para que os que aí vivem se consigam realizar pessoal e profissionalmente; tornar estes territórios mais atrativos para viver e investir, reduzindo as desigualdades e tendo como ambição, a médio e longo prazo, conseguir inverter as tendências demográficas que se têm verificado nas últimas décadas no interior.
Quais serão as prioridades do seu mandato, sendo que tem só um ano para mostrar “obra feita”?
O trabalho desenvolvido pela Unidade de Missão para a Valorização do Interior estará também na equação que permitirá avaliar o desempenho desta Secretaria de Estado. Para além do caderno de encargos que transitou, como seja a execução do Programa de Revitalização do Pinhal Interior e do Programa de Valorização do Interior, a Secretaria de Estado acompanha permanentemente toda a produção legislativa que tenha impactos no território, garantindo que a legislação aprovada se encontra mais ajustada às especificidades do território e aos objetivos do Programa do Governo para a coesão territorial e valorização do interior.
A verba do Orçamento do Estado, para o interior, é a que estava à espera?
A verba do Orçamento do Estado vai ao encontro das metas que estão definidas para este último ano de mandato. São verbas que se encontram distribuídas por vários ministérios, considerando que estamos a falar de medidas transversais a vários setores da governação, e representam já um substancial aumento dos apoios, tanto para as empresas como para as pessoas.
Quanto à instalação da sua secretaria de Estado em Castelo Branco, trata-se de uma necessidade real para a gestão eficaz daquela zona do território?
A instalação da Secretaria de Estado em Castelo Branco é acima de tudo um sinal político do compromisso do Governo para com a valorização do interior, não reduzindo em nada a sua dimensão nacional.
Segundo dados revelados, existem 1856 projetos de investimento aprovados em 159 concelhos, totalizando um montante de 1,9 milhões de euros. Estamos a falar de projetos em que áreas? Trata-se de investimento nacional ou estrangeiro?
Os dados que refere dizem respeito ao investimento nacional nas diferentes áreas setoriais, desde as indústrias transformadoras à construção, ao comércio, ao turismo, entre outras, privilegiando os projetos que apostam na inovação. No que diz respeito ao investimento estrangeiro, registamos cerca de 125 projetos, que representam mais 338 milhões de investimento e 2119 postos de trabalho.
Qual o concelho que mais se destaca neste mapa dos investimentos? Como justifica?
O concelho que registou maior número de projetos aprovados no Sistema de Incentivos de que falamos foi o de Évora, com 141 projetos aprovados, representativos de um investimento total de mais de 210 milhões de euros. Este sistema funciona por candidaturas, sujeitas a determinados critérios e que dependem sempre do impulso e iniciativa das entidades públicas e privadas.
A abolição de portagens nas ex-SCUT é um assunto que está em cima da mesa?
Os custos com as portagens são um assunto incontornável no tratamento das questões relacionadas com o interior. Sabemos o peso que esse custo tem para o desenvolvimento destes territórios e é por termos essa consciência que temos caminhado no sentido da sua redução. Depois do desconto de 15%, em agosto de 2016, o Governo assumiu agora o compromisso de um novo regime complementar de redução de taxas de portagem para os veículos afetos ao transporte de mercadorias em vias do interior, com acréscimo de desconto para as empresas que tenham a sua sede nestes territórios, representando uma redução substancial para esta tipologia de veículos.
Que outras questões poderão ser reavaliadas para uma maior valorização do interior?
Neste momento, já temos um diagnóstico e um programa muito claro para estes territórios, que nos indica que a solução passa, como já disse, pela atração de investimento que crie emprego e que permita às pessoas realizarem-se profissionalmente e fixarem-se nestes territórios. Esse investimento deve partir em grande medida do setor privado, mas temos noção do importante papel que o Estado pode e deve ter para esse fim, reduzindo custos de contexto, estabelecendo programas específicos de incentivo aos investimentos dirigidos aos territórios do interior, não esquecendo a necessidade de valorização do capital natural, muito afetado pelos incêndios de 2017, e a necessidade de criar condições de maior equidade no acesso das populações aos serviços públicos.
A concentração nos principais polos urbanos é uma realidade. O país das pequenas aldeias é para esquecer? As cidades intermédias são uma aposta interessante e necessária?
Os poucos concelhos do interior a registar ganhos na população residente são essencialmente as capitais de distrito. A concentração nos principais polos urbanos é um dado incontornável, pelo que a multiplicidade de aglomerados populacionais em que o nosso país se organizou durante décadas tenderá a desaparecer. Já tive oportunidade de me pronunciar sobre este assunto, e apesar da dureza das palavras creio que todos concordarão comigo quando digo que muitas das nossas aldeias no interior irão desaparecer, considerando o ritmo de envelhecimento e a estrutura etária das suas populações. Temos a consciência de que não será possível salvar todas as aldeias e que existem muitos lugares com localizações de muito difícil acesso, onde as populações não estarão tão protegidas perante tragédias como os incêndios. Temos de saber admiti-lo e temos de saber gerir o território considerando também essa dura realidade.
Quais são os concelhos do interior onde o rejuvenescimento é mais notório? Como justifica? De que vão à procura os jovens?
As capitais de distrito e as cidades com oferta ao nível do ensino superior são aqueles que apresentam maiores hipóteses de rejuvenescimento. As populações procuram os territórios onde têm emprego, onde têm um maior acesso a serviços, e esses são os polos onde mais facilmente encontram resposta para todas as suas necessidades. Aquilo que temos de conseguir é que as instituições de ensino superior localizadas nos territórios do interior sejam cada vez mais um polo de atração de jovens, que não só optem por vir estudar para o interior, mas aí se fixem depois dos seus estudos.
Onde se localizam e quais são os grandes polos de inovação no interior, que podem servir de íman económico e demográfico? Existem especializações nestes polos?
Temos alguns importantes polos de inovação no interior que se têm especializado. Destacaria o cluster aeronáutico de Évora como um bom exemplo disso, mas também o cluster automóvel, com forte presença nos distritos de Viana do Castelo, Bragança, Guarda e Viseu, que têm contribuído para um considerável crescimento do setor – veja-se que foi o setor que mais contribuiu para o aumento das exportações no 1.º semestre deste ano. Destacaria ainda o agroindustrial no Alentejo, a fileira da madeira no Pinhal Interior, entre outros. A especialização tecnológica em torno de determinados setores é sem dúvida estruturante para o desenvolvimento económico e para os investimentos que almejamos para estes territórios.
Quais são os principais benefícios fiscais para quem se fixa no interior?
Neste momento temos na Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2019 várias medidas que concedem benefícios fiscais à fixação no interior, como por exemplo a possibilidade de dedução dos encargos com arrendamento de imóveis quando esse arrendamento resulte da transferência da residência permanente para um território do interior, ou a aplicação de uma majoração ao valor suportado com despesas de educação e formação para estudantes que frequentem estabelecimentos de ensino situados em territórios do interior. Direcionado às empresas mas com o mesmo objetivo de fixar pessoas nestes territórios, temos também na Proposta de Lei do Orçamento do Estado uma autorização legislativa para aprovação de um regime de benefícios fiscais em função dos gastos resultantes da criação de postos de trabalho nos territórios do interior.
Que marca quer deixar nesta sua curta passagem pelo Governo?
Espero que o trabalho desenvolvido quer pela Unidade de Missão para a Valorização do Interior, quer pela agora Secretaria de Estado da Valorização do Interior, possa ser reconhecido pelos resultados que conseguiu e conseguirá ainda produzir para as populações e para os territórios do interior. Espero também que faça despertar no todo nacional a certeza de que investir e valorizar o interior não se trata de uma mera questão conjuntural, mas sim de um problema estrutural que exige políticas integradas, com uma continuidade temporal muito para além de uma legislatura.
O passo seguinte será a criação, depois das eleições de 2019, de um Ministério do Interior?
Essa é uma questão a que só o próximo primeiro-ministro poderá dar resposta.