“O NOSSO CRESCIMENTO ECONÓMICO TEM SIDO ESSENCIALMENTE ALAVANCADO NAS EXPORTAÇÕES, E ESTAS TÊM CRESCIDO SEMPRE MAIS DO QUE O PIB”
Doutorado e mestre em Ciências Empresariais pelo ISCTE-IUL e licenciado em Gestão de Empresas pelo ISLA Lisboa – atual Universidade Europeia de Lisboa –, Eurico Brilhante Dias é desde 2017 o secretário de Estado da Internacionalização. Ciente dos desafios da pasta que tutela, refere que a principal questão que se coloca é a da “continuidade do crescimento das exportações”. Nos últimos anos, Portugal tem assistido a “uma tendência muito positiva do crescimento das exportações” e é visto como uma “economia que produz bens e serviços de valor acrescentado”, contudo, é necessário “continuar a garantir esse crescimento”, ao mesmo tempo que se “diversificam mercados e se alarga a base do setor exportador”. Tendo as exportações como o “grande motor do crescimento”, Eurico Brilhante Dias destaca o grande trabalho desenvolvido pelas empresas portuguesas como indutoras de “inovação”: “As empresas mais inovadoras são aquelas que mais se confrontaram com a procura externa e com clientes exigentes”, sublinha. Quando questionado sobre as próximas eleições, o secretário de Estado afirma que o Partido Socialista “continua a ter um programa profundamente modernizador do tecido económico, aberto à inovação e à internacionalização, que faz sentido continuar a implementar”, por isso, “deve pedir o maior número de votos possível”. Por sentir a política como “uma missão de serviço público”, Eurico Brilhante Dias está disponível para “este e para outros combates”.
Quais as principais dificuldades da pasta que lhe foi confiada?
São mais desafios, mas a principal questão que se coloca, em cima da mesa, é a continuidade do crescimento das exportações. É esse o nosso maior objetivo. Temos tido uma tendência muito positiva do crescimento das exportações, mas continuar a garantir esse crescimento, ao mesmo tempo que diversificamos mercados e alargamos a base do setor exportador, é o objetivo nuclear em que nos fixamos e é nesse âmbito que todos os dias trabalhamos. Dificuldades muito particulares não existem, existem, sim, questões em mercados muito concretos, onde há custos de contexto à internacionalização das empresas portuguesas. Há, evidentemente, concorrência no quadro da captação de investimento estrangeiro, e é cada vez mais duro competir com outros territórios que, como nós, procuram fazer o seu trabalho para captar e fixar investimento. Mas eu diria que Portugal tem hoje uma boa imagem como economia que produz bens e serviços de valor acrescentado e tem, ao mesmo tempo, uma imagem de um país que acolhe bem, e com eficiência, o investimento estrangeiro.
Considera que Portugal está finalmente a afirmar-se como um país exportador? Que fatores pensa que possam ter contribuído para esse cenário?
Portugal é visto hoje como uma economia que tem estabilidade política e económica. Por outro lado, também somos vistos como uma sociedade segura e com qualidade de vida, e isso é um elemento muito importante. A segurança é hoje um elemento diferenciador da realidade portuguesa face a outros países. A forma como fomos comunicando os bons resultados da política macroeconómica, arrastando, ao mesmo tempo, a ideia de uma indústria e serviços que se foram transformando e que são hoje elementos de valor acrescentado, tem facilitado o nosso trabalho de captação de investimento estrangeiro.
Na sua opinião, de que forma a marca Portugal poderá ser melhor posicionada nos mercados externos?
Eu continuo a estar insatisfeito nessa área, acho que temos mais coisas para fazer. E essa insatisfação vem também do resultado do trabalho que temos feito. Fizemos muitas coisas nessa área, planeámos de forma cruzada com vários ministérios e com o Turismo de Portugal. Começámos a construir um plano cada vez mais integrado da comunicação do país, que não tivesse apenas a dimensão comercial. Trabalhamos com vários setores (moda, mobiliário, automóvel, etc.). Precisamos de ir mais longe, precisamos de comunicar melhor e, para além de todas as ações que já desenvolvemos, precisamos de melhorar.
Esteve, recentemente, nos Estados Unidos com a AICEP….
Fomos fazer a promoção das universidades portuguesas à maior feira de ensino superior do mundo, em Washington, onde procurámos posicionar Portugal como um país com um bom sistema científico e universitário, que é capaz de captar estudantes também nos Estados Unidos. Por outro lado, tentámos promover o maior número de protocolos entre instituições portuguesas e norte-americanas. É importante posicionarmos Portugal como um país com um bom sistema científico. Fomos também promover outros setores. É importante conseguirmos diversificar não só clientes como também mercados ou setores.
Quais são as grandes metas para 2020?
Para 2020 serão os portugueses a decidir, com as eleições. Mas em 2020 teremos de continuar a aumentar o peso das exportações no PIB e a fazer o bom caminho na captação de investimento estrangeiro – este ano creio que ainda vamos ter muito boas notícias neste campo. Acredito que esta atuação do Governo só acrescenta valor se for interiorizada pela Administração e se esta lhe der continuidade.
Acha que as exportações são o motor fundamental da nossa economia? Em que medida?
Sim. As exportações são um grande motor no crescimento. O nosso crescimento económico tem sido essencialmente alavancado nas exportações, e estas têm crescido sempre mais do que o PIB. Temos ganho também quota de mercado. Mas as exportações dão-nos ainda algo muito importante, que é o confronto e o convívio com a procura externa, em grande medida o indutor da modernização da indústria e dos serviços. Não há inovação fechada, feita só a olhar para dentro. As empresas mais inovadoras são aquelas que mais se confrontaram com a procura externa e com clientes exigentes. A verdadeira inovação parte da análise da procura, que olha para uma realidade diferente. Adaptam-se processos e produtos, e surgem novas ideias por contacto com essa procura diferente.
Portugal poderá continuar a ganhar quota de mercado mundial em termos de exportações?
Pode, porque nós precisamos de aumentar a quota de mercado para atingir os objetivos de médio e longo prazo a que nos propusemos, que é atingir, pelo menos, 50% do peso das exportações no PIB até meados da próxima década, mas para isso precisamos de continuar a crescer acima do PIB. Temos de ser ambiciosos e ser capazes de chegar a 60%, e há um movimento muito positivo na economia portuguesa que posiciona a internacionalização no centro das opções das políticas empresariais. Nós temos capacidade para fazer continuar crescer as nossas exportações.
Quais os setores que apresentam maior potencial em termos de exportações e quais os que deveriam ser deixados de lado, já que não têm potencial?
Portugal continua a ter capacidade para fazer crescer as suas exportações, de forma relativamente transversal, falando de macro setores ou indústria. O setor automóvel é um deles – embora vá sofrer alterações –, e também o setor aeronáutico – que será um setor exportador. O setor agroalimentar continua a ter grande potencialidade. Já o setor têxtil e o do calçado vivem um momento particularmente difícil. Devido às alterações climáticas, a dificuldade de gerir campanhas gera efeitos na gestão dos preços. O setor do calçado apresenta uma descida do preço do couro – diminuição da matéria-prima –, e embora estejamos a exportar mais unidades, o preço médio do calçado tem descido pela grande dificuldade de estabilização dos canais de distribuição, com a afirmação do ecomerce. Destaque também para o setor dos equipamentos e da metalomecânica, que é um dos mais exportadores, tirando o turismo. Nos equipamentos, vamos também poder continuar a crescer. Contudo, existem outras áreas em que, mais do que desinvestir, vamos que ter que tomar grande consciência daquilo que está a acontecer na economia portuguesa, pois estamos com dificuldade em fixar talento. Precisamos de mobilizar os nossos recursos da base da cadeia para a frente.
Quais os mercados que apresentam melhores perspetivas para as empresas nacionais?
Temos de continuar a diversificar dentro da Europa e não fora. Espanha, França e Alemanha continuam a ser os nossos maiores clientes. O Reino Unido, atualmente, enfrenta grandes dificuldades, pelo contexto político, pela incerteza que o mesmo tem gerado, mas nós continuamos a ter grandes possibilidades dentro da Europa. Depois, temos de continuar a apostar em mercados como o Canadá, os Estados Unidos, o México, o Japão, a China – o setor alimentar tem aqui grandes potencialidades – e os países da Aliança do Pacífico. Devemos olhar para o Brasil com grande atenção. África, nomeadamente a costa ocidental: Costa do Marfim e Senegal. Angola e Moçambique são sempre mercados interessantes, para além do Egito. Na Índia temos, também, ganho projetos. Diversificar mercados, alargar a base das exportações e apostar bem em contextos políticos onde temos conseguido abrir mercado, onde há mais estabilidade política e onde as taxas de crescimento são, claramente, superiores às que temos na Europa, tem de ser aquilo em que apostamos.
E como vê o mercado europeu, nestes tempos de turbulência? O que poderemos esperar?
A Europa vale hoje 75% das nossas exportações. O mercado europeu é decisivo para muitas empresas, quer PME quer grandes empresas. Temos consolidado quota de mercado em França, no Reino Unido, na Alemanha, em Itália e em Espanha. A Europa está a crescer, mas este é um momento de transição muito interessante.
Que tipo de consequências prevê para a Europa devido ao Brexit?
Temos hoje mais empresas exportadoras para o Reino Unido do que tínhamos quando foi anunciado o Brexit. Claro que o que acontecer até 31 de outubro é importante, mas não se vislumbra na Europa nenhuma recessão. Com Portugal, pelo terceiro ano consecutivo, a crescer acima da média europeia, cabe aos políticos continuarem a criar condições para garantir este crescimento. A nível europeu estão criadas as condições para que a Europa continue a crescer.
Quais os mercados que serão mais penalizados?
O Reino Unido será o primeiro.
Qual o estado real de Portugal em termos económicos?
Fizemos o caminho certo para proteger a economia portuguesa de efeitos nocivos. As contas públicas estão em ordem, são mesmo certas, e Portugal acabará 2019 com um orçamento equilibrado. Acabaremos 2019 com a menor taxa de desemprego desde o início do século. As maiores dificuldades que temos pela frente estão na dimensão demográfica e na quantidade de ativos no mercado de trabalho, o que é um bom problema para um governante resolver – melhor do que o desemprego. Terminamos o ano de 2019 com uma boa imagem do país.
Falou do mercado brasileiro… É um mercado muito fechado, muito protecionista?
Este é um mercado com realidades muitos distintas, onde se enfrentam restrições tarifárias de grande dimensão, especialmente nos produtos acabados. O Acordo Mercosul poderá trazer-nos uma realidade muito diferente, que temos de saber aproveitar. Acredito que portugueses e brasileiros serão os que melhor aproveitarão. Nós, porque somos exportadores de produtos acabados para o Brasil, e os brasileiros, porque são exportadores de produtos agrícolas, de que Portugal também carece.
Na sua opinião, o PS deveria pedir a maioria absoluta nas próximas eleições legislativas? Acha que a vai conseguir?
Não! Deve pedir o maior número de votos possível. Pedir aos eleitores a maioria absoluta pode parecer um pouco chantagem. O PS governou, nos últimos quatro anos, com um governo minoritário e atingiu os seus objetivos. Evidentemente, o PS precisa de mais força para prosseguir e implementar o seu programa e deve pedir aos portugueses a sua confiança. Não nos podem levar a mal pedir à generalidade dos portugueses o seu voto.
O PS está preparado para governar, tendo por base a situação atual, durante mais quatro anos?
O PS continua a ter um programa profundamente modernizador do tecido económico, aberto à inovação e à internacionalização, que faz sentido continuar a implementar. Industrializar, capitalizar e a indústria 4.0 foram sempre instrumentos políticos que estiveram em cima da mesa. Existem elementos de modernização da Administração Pública em que convém continuar a apostar. O PS tem programa e quer continuar a aplicá-lo.
Caso o PS vença, está disponível para continuar o trabalho que tem vindo a desenvolver?
Eu gosto muito do que faço, e só assim é possível executar estas funções. Sinto-me uma pessoa realizada, pois esta é a minha área. Sinto-me a tocar nas áreas essenciais. Tudo isto dá-me ambição para querer fazer mais coisas. Agora, a política tem contingências várias… Contudo, estou sempre disponível para este e para outros combates.
A política para si é uma paixão ou uma missão?
As duas coisas. A política não se faz sem fortes doses de paixão e comprometimento. Quem exerce cargos públicos tem uma missão a cumprir, que é servir a comunidade e o bem público. Não há uma separação entre as duas. É preciso saber persistir e continuar porque há adversidade. É preciso gostar muito, pois este é um trabalho sempre precário, mas é uma missão de serviço público.
Que marca deixou neste Governo que vai agora acabar?
Quando se olhar para trás, vai ser possível ver que as exportações continuaram a crescer, que atingimos o melhor ano de sempre de contratualização do investimento e que conseguimos introduzir processos na promoção externa de aumentos de escala e de maior agregação, que devem prosseguir. Mas, estamos a meio do caminho. Há ainda muito para fazer para a frente!