ÁGUA: AUMENTOS PARA A MAIORIA, REDUÇÃO PARA ALGUNS
A maioria da população vai ver a fatura da água a aumentar, mas os preços tenderão a uniformizar-se em todo o país. O Governo espera a redução de custos na ordem dos 2700 milhões de euros com a agregação dos vários sistemas da Águas de Portugal. Oposição e muitos municípios estão contra.
Mais de 200 concelhos do país afetados, um aumento do preço da água para a maioria da população portuguesa, um emagrecimento do grupo Águas de Portugal e uma redução de custos na ordem dos 2700 milhões de euros, segundo o Governo. São estas algumas das novidades da reforma do setor da Água que o Executivo aprovou recentemente e que tem no ministro do Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, Jorge Moreira da Silva, o principal protagonista. Logo no Conselho de Ministros onde foi aprovada, o governante disse tratar-se de uma reforma “ampla e abrangente”, recordando que “o Governo sempre disse que não admitia privatização das águas, mas também não admitia que nada se fizesse”. Mas as reações não se fizeram esperar e a oposição, liderada pelo PS, veio falar em “esbulho” e num “grave prejuízo para as pessoas e para as câmaras municipais do distrito de Lisboa”. E porquê? Porque o Governo está a esbulhar, segundo o PS, as câmaras municipais que geriram bem os seus sistemas, ao agregá-los numa nova empresa onde são também integrados sistemas deficitários. Na prática, a reforma agrega as 19 empresas multimunicipais do grupo Águas de Portugal em cinco novas entidades multimunicipais de abastecimento de água e saneamento com o objetivo de harmonizar as tarifas em todo o país. Mas o próprio ministro Moreira da Silva admitiu, numa entrevista à Antena 1 e ao Económico que as tarifas da água subirão “para uma larguíssima maioria da população”, ao prever aumentos para as zonas litorais, que hoje pagam a água mais barata, por forma a ser possível reduzir essas mesmas tarifas no interior. A ideia é gerar mais receita, mas também tratar todos os consumidores da mesma forma, como acontece com a eletricidade e o gás canalizado, diz o ministro, argumentando que “o setor não é sustentável”, “temos tarifas no litoral que são três vezes inferiores às do interior” e “temos proveitos que são 35% inferiores aos custos”. Não admira assim que o sistema tenha de gerir “défices tarifários crónicos de 600 milhões de euros” e dívida dos municípios “de 500 milhões”. Com a reforma do setor, o Governo pretende fazer com que as tarifas venham a convergir no prazo de cinco anos, até se chegar a uma tarifa única entre interior e litoral.
No imediato, os cidadãos do interior norte verão reduzida a sua tarifa mensal em 3 euros e os do litoral norte terão um agravamento gradual ao longo destes cinco anos de 30 cêntimos anuais. Nos quase 70 municípios onde as tarifas podem aumentar vivem cerca de 5,2 milhões de pessoas, o que explica portanto a afirmação de que a maioria da população verá a sua fatura da água crescer. Apesar de a ideia ser fazer com que o litoral pague mais para permitir que o interior pague menos, no final existem concelhos na costa que também beneficiam de uma baixa dos preços. Além disso, concelhos como Paços de Ferreira, Trofa, Vila do Conde, Espinho, Santo Tirso, Ovar e Mafra, que já hoje pagam mais caro pela água, verão mesmo assim as suas faturas aumentarem, enquanto que em Vila Real, Torres Vedras e Alenquer irão baixar. Em termos médios, as contas do Ministério do Ambiente apontam para uma redução de 4,1 mil milhões de euros no valor das tarifas cobradas face aos atuais contratos, considerando todo o período de concessão até 2045. No entanto, é preciso não esquecer que são as autarquias que definem os preços e estas podem decidir não refletir no consumidor estes aumentos. Outra medida que visa a coesão territorial passa pela localização das sedes das novas empresas, ficando a Águas do Norte em Vila Real, a Águas do Centro Litoral em Coimbra, e a Águas de Lisboa e Vale do Tejo na Guarda. Com a agregação das várias empresas do grupo Águas de Portugal, o Executivo poupa nos órgãos sociais e espera ver reduzida esta fatura em 2700 milhões de euros, uma média de 91 milhões de euros por ano, dos quais 25 milhões são custos com pessoal. Isto porque haverá, segundo o ministro, “uma redução de dois terços dos órgãos sociais”, passando o número de administradores de 70 para 20 e o de diretores de 300 para 150.
Municípios mais afetados prometem ir aos tribunais
A reforma não é, no entanto, pacífica, e os municípios mais afetados pelos aumentos já estão a tentar travá-la nos tribunais. Recentemente, por exemplo, Sintra aprovou por unanimidade uma moção contra a reforma, por “abrir a porta para uma futura privatização” e levar a “um aumento brutal das tarifas”, e, tal como Amadora, Cascais e Oeiras, já anunciou que irá contestar nos tribunais a integração no novo sistema de Lisboa e Vale do Tejo. A nível nacional, também o PS garantiu que irá usar “todos os mecanismos judiciais e parlamentares” para travar a reforma. Não é, por isso, certo quando entrará em vigor esta reforma. O Executivo pretende que seja já este ano, mas depende não só da promulgação do decreto-lei que cria a nova arquitetura do setor, como de um parecer do regulador, para o qual é preciso fundamentar a conclusão de que a fusão gera os benefícios económicos anunciados. É preciso não esquecer que a ERSAR já chumbou o primeiro plano de reestruturação apresentado, por considerar que esses ganhos não eram evidentes.