NOVAS REGRAS NA BANCA

50NOVAS REGRAS

As novas regras europeias entraram em vigor para a banca e fazem parte dos planos para a União Bancária Europeia, um projeto lançado no verão de 2012.

A crise que teve início no final da década passada veio trazer à tona as fragilidades da união monetária existente na Europa. A zona euro é, sem dúvida, uma construção muito vulnerável, e o elo existente entre os Estados soberanos e os bancos dos respetivos países fazia com que a perceção de risco de um estivesse muito ligada à de outro. Isto acontece uma vez que os bancos têm como um dos ativos principais nos seus balanços a dívida pública do respetivo país. Quando se geram receios em torno das dívidas públicas, os bancos ficam fragilizados uma vez que deixam de ter condições para emprestar à economia, contribuindo para a subida dos juros da dívida. A União Bancária pretende erradicar este cenário contribuindo para uma menor dependência entre os dois intervenientes. O Mecanismo Único da Supervisão (MUS) é o primeiro pilar da União Bancária e já está implementado desde 2014. Tal como é indicado pelo seu nome, este é um organismo responsável pela supervisão da atividade dos bancos na zona euro e tem como função garantir estabilidade financeira. Composto pelo Banco Central Europeu (BCE) e pelos bancos centrais nacionais, o MUS ou SSM (sigla anglo-saxónica) tem como um dos principais objetivos harmonizar as regras para todos os bancos, bem como analisar os balanços dos bancos e escrutinar as várias formas como os bancos operam no mercado, procurando assegurar a sua estabilidade. Conhecido pela sigla SRM, o Mecanismo Único de Resolução – o segundo pilar – tem como face visível o Conselho Único de Resolução, um organismo que tem como responsabilidade decidir, preparar e executar, em conjunto com as autoridades nacionais, situações de resolução de um banco. O SRM entra em ação quando o BCE indicar que esse banco está a falir ou tem grande probabilidade de falir.

Mas afinal o que mudou?

A diretiva europeia já tem vindo a ser transposta para a lei nacional nos vários países, mas apenas a 1 de janeiro entrou em vigor a componente crucial do bail in, ou recapitalização interna. Este conceito de bail in nasceu em oposição ao bail out que marcou os anos da crise. A diferença entre as duas situações prende-se com o facto de nos bail out a ajuda financeira vir de fora do banco (os contribuintes), ao passo que com o bail in só em último caso é que isso acontecerá. Antes de entrar um cêntimo que seja de dinheiros públicos, há uma hierarquização dos agentes expostos ao banco (stakeholders), que sofrem perdas para evitar, ou pelo menos limitar, esse recurso aos contribuintes. Durante a crise, as recapitalizações e resoluções de bancos – de modo a evitar males maiores – foram feitas penalizando, apenas, os stakeholders acionistas e os detentores de dívida (no caso do BES protegeu-se, numa primeira fase, a dívida sénior), sendo que os depositantes estavam sempre protegidos. Com as novas regras, os detentores de dívida sénior e – muito importante – os depositantes com mais de 100 mil euros serão também afetados. A ordem hierárquica será assim, e por esta ordem, os acionistas, detentores de dívida subordinada, de dívida sénior e (ao mesmo nível desta) os depósitos das grandes empresas superiores a 100 mil euros. Em último lugar, e se os restantes elementos da hierarquia não forem suficientes para absorver as perdas, serão implicados os depósitos não cobertos pelo Fundo de Garantia (valor acima de 100 mil euros) pertencentes a micro, pequenas e médias empresas e aos particulares.

Depósitos acima dos 100 mil euros: risco controlado

52Segundo as novas regras, os depósitos acima dos 100 mil euros passam a fazer parte dos ativos que podem ser utilizados para absorver perdas no caso de uma resolução. Mas isso não é algo automático. Em primeiro lugar é possível que o banco possa recorrer a outros ativos e passivos que façam com que não seja necessário, face à insuficiência de capital, chegar aos depósitos. Por outro lado e em determinadas circunstâncias, é possível que a autoridade decida proteger os depósitos se considerar que podem estar em causa consequências sistémicas. Mesmo com as novas regras, decidir se os depositantes (sempre acima dos 100 mil euros) são chamados a participar na resolução de um banco é uma função da autoridade de resolução competente – Conselho Único de Resolução ou a entidade nacional (Banco de Portugal). Mas ainda assim, é necessária uma aprovação do Conselho Único de Resolução. O objetivo de todas estas regras é evitar ou minimizar a necessidade de recorrer a fundos públicos para lidar com problemas em bancos. Mas estas mudanças levam a consequências na forma como os bancos se financiam – porque se anteriormente havia a perceção de que dívida sénior e depósitos (acima de 100 mil euros) eram protegidos, agora isso deixa de ser assim.