PORTUGAL 2030

YC7H2445QUE FUTURO PARA O DESPORTO EM PORTUGAL

 

“Que futuro para o Desporto em Portugal” foi o tema central de mais um debate do ciclo Portugal 2030, promovido pela Revista FRONTLINE, uma reflexão que reuniu Hermínio Loureiro, vice–presidente da Federação Portuguesa de Futebol, José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal, e Pedro Moura, presidente da Federação Portuguesa de Ténis de Mesa, no passado dia 15 de outubro, no Hotel InterContinental, em Lisboa.

Orador1Hermínio Loureiro, vice-presidente da Federação Portuguesa de Futebol, José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal, e Pedro Moura, presidente da Federação Portuguesa de Ténis de Mesa, foram os oradores convidados para mais um debate do ciclo Portugal 2030, promovido pela revista FRONTLINE, com o objetivo de trazer para o espaço público novas ideias e novas abordagens. “Que futuro para o Desporto em Portugal?” foi o mote proposto para esta reflexão. Desde logo, uma primeira ilação transversal que ficou bem expressa nas intervenções de todos os oradores foi a da importância deste tipo de iniciativas quando é assumido que em relação ao desporto se reflete pouco, se trabalha muito em “cima da espuma do dia”, como afirmou Hermínio Loureiro, o que leva a que preparar e pensar a longo prazo seja algo frequentemente esquecido. E foi precisamente a Hermínio Loureiro que coube abrir o debate. Numa saudação especial a Pedro Moura, pela recente conquista dos seus atletas do título de campeões europeus por equipas em Ténis de Mesa, relembrou que este campeonato foi organizado por nós, e Portugal mostrou uma vez mais que é capaz de organizar eventos desportivos de grande dimensão, “tem infraestruturas para isso, deu retorno ao país e teve sucesso desportivo”. Entrando no debate em concreto, o vice-presidente da Federação Portuguesa de Futebol lançou uma questão a partir da qual sintetizou em 20 pontos a sua visão de futuro para o desporto em Portugal: “Em 2030, o que é que eu gostava que o desporto tivesse?” Para Hermínio Loureiro, o essencial passa logo pela necessidade de haver muito mais praticantes do que temos hoje, o que é um desafio de todos. Em segundo lugar, haver mais cultura desportiva e menos cultura clubística. Terceiro ponto focado foi a necessidade de termos melhor organização para além de precisarmos todos de ter mais credibilidade. O olhar sem complexo para as universidades foi outra das questões referidas, havendo necessidade de aproveitar e potenciar a excelência destes centros de “saber” que já têm reconhecimento internacional. Mais resultados desportivos e novas políticas desportivas e uma fiscalidade mais amiga do desporto foram também pontos centrais defendidos por Hermínio Loureiro. Sobre esta última questão, o orador manifestou mesmo a sua incompreensão pelo facto de um espetáculo desportivo ter uma taxa de IVA a 23% quando a generalidade dos espetáculos tem uma taxa de 6%, entre outras coisas: “Acho que a fiscalidade precisa de dar um sinal ao desporto, no mecenato, na majoração, naquilo que são os contributos das empresas às federações, aos clubes, e que acabemos com esta rigidez e preconceito em relação ao desporto”. Aumentar a concertação setorial foi outro dos pontos referidos por Hermínio Loureiro, focando o exemplo incompreensível de como é que um setor como o Turismo está de costas voltadas para o desporto. Outra ideia que saiu também das suas palavras foi a necessidade de o Estado não atrapalhar, assumindo uma atitude mais facilitadora, referindo mesmo que se tem avançado bem neste sentido e dando o exemplo do atual secretário de Estado do Desporto, que “com poucos recursos financeiros tem procurado resolver alguns problemas”. E não deixou também de referir a necessidade de diminuir a carga burocrática que hoje ainda existe, até por vezes incompreensível face às inovações tecnológicas e aos mecanismos informáticos que já estão à nossa disposição. Outra questão central abordada nesta síntese inicial foi a imperativa necessidade de o desporto na escola ter mais espaço e assumir uma outra importância curricular do que a que tem hoje, para além de, como enfatizou o vice-presidente da FPF, ser também de imperativa necessidade que um atleta de alta competição consiga conciliar a sua vida académica com sucesso desportivo e não tenha necessariamente de ficar uma delas para trás: “espero que isto seja uma realidade em 2030”. E concluiu as suas palavras, alertando também para a necessidade de aumentarmos a nossa competitividade desportiva, a nossa autoestima, o orgulho de sermos portugueses e que “pensemos o fenómeno desportivo, como estamos aqui a fazer hoje, de uma forma aberta, que nos concentremos verdadeiramente no que é essencial, porque muitas vezes no desporto perdemos muito tempo com questões laterais”. Uma última nota que Hermínio Loureiro não quis também deixar de referir prende-se com os fundos comunitários, e deixou o alerta: “Ainda não li a totalidade do Acordo de Parceria Portugal 2020, mas parece-me que o desporto está relegado para um papel próximo do zero, o que é preocupante e vai ter reflexos num futuro próximo. Isto para além de falarmos sobre o que se passa na nossa economia, o que se passa por exemplo no BES e na PT, que são das empresas que, nos últimos anos, mais têm apoiado o desporto, para além de todos sabermos que o desporto é o instrumento mais barato de saúde pública e portanto é imperativo investir na promoção de hábitos de prática desportiva, nomeadamente nas escolas do 1.º ciclo.”

Presença do Comité Olímpico de PortugalOrador2

José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal, iniciou a sua intervenção chamando a atenção para dois aspetos que considerou essenciais nesta reflexão. Um primeiro aspeto que tem a ver com a previsão demográfica do país para 2030, com uma quebra acentuada da natalidade e com um aumento da esperança média de vida, o que significa que vamos ter uma sociedade com menos pessoas e mais envelhecidas. Naturalmente, o perfil de prática desportiva tenderá a mudar e vai introduzir alterações significativas ao modelo dominante, designadamente na dificuldade de recrutamento para as práticas de alto rendimento e a necessidade de introduzir modelos que deem resposta a uma população com um índice de longevidade superior ao atual. Se assim for, todas as organizações desportivas vão ter necessidade de se adaptar a esta nova realidade: “Por exemplo, alguns estudos estimam que a redução da nossa população nos próximos 40 anos possa atingir os 2 milhões de pessoas. E isto vai-nos colocar problemas, quer do ponto de vista da nossa organização desportiva, quer do ponto de vista da nossa competitividade externa, não ignorando que o quadro que Portugal está a passar é igual em toda a Europa, mas num país com maiores fragilidades.” O segundo aspeto levantado pelo presidente do Comité Olímpico apontou para o facto de Portugal só poder ser um país desportivamente diferente daquilo que é hoje se o desporto ocupar um lugar diferente na vida da nossa comunidade: “basicamente, a organização desportiva resulta da dinâmica de dois setores – a sociedade civil e o setor da governação – e qualquer alteração do ponto de vista qualitativo exige mudanças aos dois níveis, ou seja, não basta mudar políticas, é necessário que também seja diferente a relação da comunidade com a vida desportiva. Nós somos um país que discute muito, mas debate pouco no sentido de criar uma consciência crítica e alguma doutrina em relação ao modo como deve encarar os problemas da organização desportiva”. Para José Manuel Constantino, as questões fundamentais no domínio da organização desportiva não se colocam tanto do ponto de vista da dominante financeira – embora seja importante e até decisiva nalguns setores –, mas tudo poderia ser mais fácil se o lugar que o desporto ocupa na vida de todos nós, quer da comunidade civil quer da política, fosse diferente: “estamos perante um conjunto de sinais que revela que o desporto é desqualificado do ponto de vista da sua valorização social, o que é um aparente paradoxo, porque quando ouvimos responsáveis, políticos, associativos, ou mesmo participamos em debates desta natureza, elenca-se um conjunto de vantagens, de contributos e de mais-valias que o desporto traz à sociedade, mas que depois não se traduz em termos de organização da vida desportiva. Por exemplo, quando se mexe nas condições que são oferecidas às crianças e aos jovens em idade escolar, e se desvaloriza essa componente, o sinal que estamos a dar é que isso não é muito importante”. Para o presidente do COP, vivemos nos últimos anos sob o anátema de que o importante para as crianças em idade escolar é a matemática, é a internet e o espírito de empreendedorismo e iniciativa: “Curiosamente, em Portugal esta mensagem é-nos trazida por um governo socialista, repetindo aquilo que Berlusconi tinha feito em Itália. Ora, a educação física sofreu as consequências desta degradação e curiosamente foi desfavorecida não em nome de um qualquer paradigma científico, mas sim por força de uma lógica de natureza política e ideológica. Não é possível a nenhum país elevar a qualidade da sua vida desportiva desvalorizando um elemento de formação fundamental nas crianças e nos jovens em idade escolar.” E prosseguiu o orador: “Este sinal está repetido num conjunto de outras questões, por exemplo, na área da investigação científica no desporto, nas bolsas para essa mesma investigação e até numa coisa que aqui já foi falada, como é o caso do Plano Nacional do Turismo, no qual existem três clusters desportivos, uma comissão governamental de acompanhamento, mas não há ninguém do desporto. Foram esquecidos.” São todos estes sinais, segundo José Manuel Constantino, que revelam a falta de importância que é dada às questões de natureza desportiva e é onde reside o grande problema, considerando que tudo seria mais fácil se o projeto desportivo fosse um projeto de sociedade e fosse sentido como uma necessidade que traz mais-valias à sociedade, que tem um valor económico, educativo, cultural e social, e para a qual é necessário mobilizar os portugueses. Uma última questão mereceu também a atenção do presidente do COP, no que diz respeito à relação do olimpismo com a agenda mediática, fenómeno que leva a que tal realidade se venha a esgotar, do ponto de vista da perceção pública, apenas na altura dos Jogos Olímpicos: “o que se passa em Portugal não é muito diferente do que se passa na generalidade dos países, mas aquilo que eu quero ressaltar de mais importante é que todos os dias as nossas federações estão empenhadíssimas em garantir a presença olímpica”.

Orador3Federação Portuguesa de Ténis de Mesa

Já Pedro Moura, presidente da Federação Portuguesa de Ténis de Mesa, situou a sua intervenção no seu quotidiano de dirigente desportivo, procurando extrapolar ilações, mas muito centrado na lógica de que, segundo as suas palavras, é preciso perceber que “o desporto é o momento, como nós o estamos agora a viver no Ténis de Mesa por força deste título europeu agora conquistado. Ou seja, planear e planificar a 15, 20 anos, por muito bem pensado que seja, tem sempre imponderáveis que podem fazer ruir qualquer projeto desportivo à mínima bola na trave ou, no meu caso, na rede”. Apesar deste enquadramento, para Pedro Moura é indiscutível que daqui a 15 anos o desporto será quilo que for pensado e decidido agora, mas a perspetiva não é otimista: “A visão de um dirigente desportivo que vive esta realidade diariamente é que tem a grande responsabilidade de criar um desporto em Portugal, porque todas as políticas desportivas não têm levado a que este seja um desígnio nacional e acaba por estar muito dependente dos pequenos passos que cada federação desportiva vai conseguindo dar. Ou seja, foi para nós que foi passada a responsabilidade de desenvolver o desporto na área do lazer; que foi passada a responsabilidade, num quadro de tremenda dificuldade financeira, de incentivar o desporto escolar, e tudo isto em projetos elaborados ao momento e que tornam muito difícil projetar e planear no médio prazo.” Pedro Moura acabou também por situar que olhar para o desporto daqui a 15 anos é o mesmo desafio que enfrenta hoje, na sua federação, porque na verdade alguém terá feito um mesmo momento, de parar e pensar, há 15 anos atrás, o que conduziu a este crescente da modalidade e permitiu, por exemplo, hoje, a conquista de um título europeu: “E tudo isto é mais relevante quando sabemos que o ciclo destes atletas olímpicos terá naturalmente o seu términus e as nossas opções terão de nos permitir manter a modalidade de Ténis de Mesa como uma modalidade que queremos de referência. Agora acredito que um país com a nossa dimensão demográfica e económica terá de tomar opções muito sérias se quiser ter algum protagonismo dentro do mundo olímpico internacional.” Verdade assumida para o presidente da Federação de Ténis de Mesa é que os homens do desporto não gostam de fazer grandes previsões, mas é indesmentível que nos Jogos Olímpicos de 2016 o Ténis de Mesa será uma das modalidades que poderão trazer algum destaque à participação portuguesa, assim como hoje a seleção portuguesa é a quarta seleção no ranking mundial, algo verdadeiramente impensável há alguns anos: “Agora, prever, apontar o que nos acontecerá em 2030, é algo muito difícil para qualquer dirigente desportivo, para qualquer federação desportiva, mais ainda com as dificuldades com que vivemos”, foi a ideia com que concluiu.