PERSONALIDADES 2014

2014:DOZE NOMES QUE NÃO VAMOS ESQUECER

Por cada ano que passa, nomes, factos e figuras ficam retidos na memória pelo protagonismo, para o bem ou para o mal, que imprimiram a determinado momento, localizado no espaço e no tempo. Se deles ficam memórias ou as suas ações arrastam ou arrastarão consequências futuras, a cada um de nós competirá julgar. Para a FRONTLINE, 12 nomes serão incontornáveis neste ano que entra, sem mérito ou desmérito para os muitos que ainda se venham a revelar.

 

Pedro Passos Coelho

Ainda é o primeiro-ministro de Portugal e, mais do que determinado em cumprir o seu mandato até ao fim, Passos Coelho já deixou bem clara a sua intenção de continuar à frente dos destinos do PSD e de renovar o seu mandato nas próximas eleições legislativas à frente dos destinos do país. Mas o degaste político de três anos de governação provocado por um rigor de austeridade, que poderá ter sido levado a um limite que muitos clamam como não necessário, poderá seriamente comprometer essa ambição. Para Passos Coelho, 2014 será o ano de todos os perigos. E mesmo que se venha a cumprir o final da intervenção externa da troika no próximo mês de maio, e a possibilidade de Portugal entrar na rota de sucesso da Irlanda comece a ganhar corpo, o certo é que para o primeiro-ministro a solução ideal seria o país ficar sob a alçada de um programa cautelar, um álibi político que lhe permitiria e justificaria a coerência do rumo de governação até agora seguido, mas que abriria espaço para PSD e centro-direita tentarem recuperar a confiança do eleitorado com base num novo projeto político para um Portugal saído da crise.

 

Paulo Portas

Protagonista de uma demissão não anunciada e de uma decisão irreversível que afinal foi revogada, Paulo Portas atirou o país para uma crise política que hipotecou tudo e todos, desde o Governo ao Presidente da República, aos partidos da oposição, e contrariando todos os vaticínios, não só resistiu como politicamente reforçou a sua posição ao longo do último ano. 2014 vê-o chegar como um líder incontornável no CDS, após um congresso esmagadoramente vitorioso, e o recente aceno dos sociais-democratas a uma futura coligação política torna-o incontornável em qualquer solução de governação à direita dos socialistas. A única questão em aberto e que este ano os portugueses terão de ver esclarecida é se a sua tão já falada indigitação para o lugar de Comissário Europeu corresponde a um desejo seu de cumprir outros desígnios em prol do seu país ou, por outro lado, ao desejo de muitos de o verem afastado, facilitando o caminho à aspiração governativa de outras forças políticas.  Mas a verdade é que, como muitos outros, 2014 será mais um ano de Paulo Portas.

 

António Costa

O atual presidente da Câmara de Lisboa tornou-se, para a generalidade da esquerda portuguesa, uma espécie de grande trunfo político, mas que ainda ninguém sabe como ou quando será jogado. Na verdade e depois da esmagadora vitória conseguida na capital do país nas últimas eleições autárquicas, o seu perfil tanto encaixa na liderança política partidária – onde muitos o veem como o único capaz de levar o PS à vitória nas próximas eleições legislativas – como na corrida presidencial, colhendo um amplo consenso político nos mais variados setores da sociedade portuguesa. Se é verdade que a decisão final lhe caberá sempre, também é verdade que António Costa corre contra o tempo, mais ainda pesando as adversidades que a atual conjuntura política tem representado para o centro-direita, incluindo o Presidente da República. Ou seja, António Costa não poderá deixar passar muito mais tempo sem deixar sinais inequívocos de quais são as suas intenções políticas no futuro próximo. Ou marca terreno este ano ou corre o risco de cair no paradigma do trunfo que pode ser tão valioso que se guarda até ao fim, muitas vezes perdendo-se a oportunidade de o jogar para conseguir ganhar. O futuro o dirá.

 

António José Seguro

Para o líder socialista 2014, será o ano da verdade. Ou António José Seguro consegue afirmar-se como alternativa governativa, ou perderá para sempre não só a almejada possibilidade de vir a ser primeiro-ministro, como também o partido e a simpatia do país. Até agora, os socialistas têm vivido mais do desmérito do Governo do que do mérito da sua ação política enquanto maior partido da oposição. Para os portugueses começa a ficar claro que, na atual conjuntura política, os papéis entre PS e PSD se inverteriam, o discurso de uns seria o dos outros no mesmo lugar. O vazio de ideias para um Portugal de futuro, mas futuro esse que começa já amanhã, tem assistido tanto ao PS como ao PSD, e António José Seguro ainda não conseguiu romper este véu e convencer o país de que a alternativa está do seu lado. Terá por isso mesmo de ser um dos políticos mais ativos neste ano que agora entra, mas com particular atenção aos seus pares, que espreitam o mínimo deslize para o enfraquecerem na praça pública. O líder socialista vai ter de enfrentar três frentes de batalha duríssimas: o país, o Governo e o próprio Partido Socialista. Vamos ver se estará à altura.

 

Cavaco Silva

Se existia algo que ficou claro ao longo do último ano e que certamente não mudará nos tempos vindouros é que a vasta maioria dos portugueses não quer este Presidente da República. E esta é também uma realidade política sem precedentes na história democrática do país. Cavaco Silva será porventura o mais incompreendido de todos os presidentes da República, mas foi a condução da sua ação política – por mais bem intencionada que sempre tenha sido e não subsistam dúvidas de que o foi – que rompeu o compromisso do pilar de garante democrático de equidade e liberdade que os portugueses sempre reconheceram aos sucessivos presidentes desde o 25 de Abril de 1974. O perfil excessivamente institucional e a perceção assumida pelos portugueses de excessiva “colagem governativa” a Passos Coelho por parte da Presidência da República, perceção que nem Cavaco nem os seus mais próximos colaboradores conseguiram até hoje desconstruir, contribuíram decisivamente para que os portugueses fizessem uma leitura partidária do exercício de Cavaco Silva como o mais alto magistrado da Nação. 2014 não será certamente diferente.

 

Paulo Macedo

Será porventura o único ministro a quem será reconhecido um papel reformista neste Governo e sobretudo numa área tão problemática como a da Saúde. Mais uma vez, Paulo Macedo faz reconhecidamente jus ao seu percurso profissional ao protagonizar um movimento de reforma até hoje sem precedentes e conseguindo conduzir a sua ação política sem grande crispação nos mais variados agentes, desde os profissionais de saúde, aos utentes, aos privados envolvidos no setor. Não significa isto que até agora as decisões do ministro tenham sido sempre as mais acertadas, mas significa que o recurso ao diálogo, a assunção de responsabilidades e a resistência à tentação política de estar sistematicamente a encontrar bodes expiatórios que justifiquem determinadas medidas ou rumos de ação são determinantes para o bom caminho de qualquer movimento reformista. Paulo Macedo já tinha dado provas destas qualidades enquanto esteve à frente da Direção-Geral dos Impostos e voltou a afirmar-se enquanto ministro da Saúde. 2014 será apenas mais um ano dos muitos que certamente ainda terá pela frente, independentemente das opções políticas que triunfarem num futuro próximo neste país.

 

Barak Obama

O recente aperto de mão de presidente americano a Raul Castro nas cerimónias fúnebres de Nelson Mandela vieram mais uma vez provar que é Barak Obama que está a mudar a América e não a América que está a mudar com ele. A afirmação não é um mero exercício linguístico, mas sim a prova da capacidade que Obama tem revelado para consolidar uma imagem diferente da mais poderosa nação do mundo. Obama tem sido o obreiro de uma nova América, menos bélica mas não menos determinada, mais humanista e mais preocupada com os menos favorecidos mas sem ferir os valores culturais do American dream, e a agudização de alguma crispação política entre democratas e republicanos é a prova de que as suas reformas estão a abalar muitos dos interesses até então instalados. O “We can” de Obama acabou por representar uma viragem simbólica no exercício do poder norte-americano dentro e fora das suas fronteiras. Obama não é o primeiro presidente negro dos Estados Unidos, mas sim o primeiro presidente de uma nova América e da afirmação do seu protagonismo na procura de uma nova ordem mundial.

 

Papa Francisco

Para muitos a sucessão era óbvia e asseguram fontes fidedignas que o seu destino já estava traçado desde a eleição do anterior Papa Bento XVI. A grande dúvida reside em saber se a Igreja Católica é capaz de acompanhar a dinâmica reformista de Francisco, mas a força da sua nova evangelização e a sua aproximação aos fiéis, rompendo o afastamento cada vez mais preocupante que dominou o prelado do seu antecessor alemão, tem sido tão avassaladora que será difícil ouvir vozes erguerem-se contra o seu magistério. Francisco não tem parado de surpreender tudo e todos ao abordar com uma simplicidade desconcertante temas-tabu da doutrina católica, como o aborto, ou, ao batizar, a acolher no seu seio filhos de casamentos civis ou de mães solteiras, como protagonizou já no início deste ano numa cerimónia na Capela Sistina. Surpreendente também tem sido a sua relação com os mais jovens, e prova dada foi aquilo a que todos puderam assistir na última Jornada Mundial da Juventude, que coincidiu com a visita papal ao Brasil. Ficou sobretudo a imagem de singela humildade de um Papa que parece apostado em retomar o carisma da popularidade de João Paulo II.

 

Edward Snowden

Apesar dos esforços do Parlamento Europeu, cuja Comissão das Liberdades Civis aprovou uma audição ao ex-consultor dos serviços secretos norte-americanos, Edward Snowden irá desaparecer tão rapidamente como apareceu. Na verdade, as revelações de Snowden, que está refugiado na Rússia depois de ter posto a descoberto a existência de uma rede de espionagem eletrónica por parte dos Estados Unidos, nada trouxeram de novo, e se algum impacto acrescido tiveram, este resultou da alegada inclusão de alegados indícios de espionagem telefónica a diversos líderes mundiais.Snowden não percebeu que foi apenas apanhado numa teia de interesses políticos tão efémera como as suas próprias revelações. Apenas o Velho Continente, como prova esta investida do Parlamento Europeu, insiste em recuperar algum protagonismo numa temática que aparentemente divide apenas opiniões políticas. Mesmo para Obama, esta mediática crise praticamente não teve reflexos nenhuns. Quanto aos cidadãos, uma larga maioria já parece consciencializada de que a segurança impõe, por vezes, limites a algumas liberdades e garantias, mas que em nada interferem com a sua vivência em democracia.

 

Angela Merkel

A chanceler alemã saiu reforçada nas últimas eleições mas não propriamente vencedora. O espetro de uma Europa em rápida mutação política parece ameaçar a solidez das decisões germânicas e a sua concordata aceitação no que respeita ao espaço europeu. Teve de ceder politicamente, e tanto Merkel como a própria economia alemã não terão um ano fácil pela frente. Como se não bastasse, também o fantasma daquele que um crescente número dos seus concidadãos considera ser o último grande líder de referência da condução política dos destinos do seu país, Helmut Khol, ensombra cada vez mais a própria personalidade e imagem que ao longo dos últimos anos Merkel construiu. Merkel será ainda politicamente incontornável, mas 2014 poderá marcar o fim de um ciclo de hegemonia económica e, consequentemente, política, desta Alemanha que nas duas últimas décadas tem reclamado o mérito de manter uma Europa unida na lógica de construção do projeto europeu, mas com custos que muitos Estados-membros já não estão dispostos a pagar. Uma certeza porém existe: as novas políticas reclamadas para uma Europa em declínio já não refletem a visão de Merkel para uma União Europeia.

 

Dilma Roussef

A presidente brasileira não herdou tarefa fácil ao suceder ao carismático Lula da Silva, mas logo no ano seguinte à sua eleição, em 2010, Dilma caminhou a passos largos para o seu apogeu político, mais no domínio internacional, pois no plano interno a sucessão de escândalos de corrupção e afastamento de ministros envolvidos logo cedo não deixou de lhe dar tréguas. Mesmo assim Dilma foi resistindo, mas a curva da sua erosão política tem vindo continuamente a acelerar e entra em 2014 já com um pesado fardo ao tentar esgrimir as acusações e incertezas de o Brasil ser capaz de organizar o campeonato do mundo de futebol. Esta é uma pesada herança num país em que o futebol é desporto-rei, e logo no ano em que a atual Presidente brasileira vai ter de enfrentar novas eleições. Com Lula da Silva fora da jogada é cada vez mais notório que a maioria dos brasileiros quer afastar o PT do poder e Dilma vai ter de enfrentar uma oposição política de peso, talvez a mais expressiva até hoje, na corrida presidencial. 2014 será o seu ano, para o bem ou para o mal, dividida entre a incerteza da vitória ou de um rápido esquecimento da sua curta carreira de estadista.

 

Cristiano Ronaldo

Infelizmente, o corolário do sucesso de Cristiano Ronaldo coincidiu com um momento de tristeza para todos os portugueses assinalado pela morte de Eusébio da Silva Ferreira, mas a verdade é que Portugal continua a afirmar os seus valores de uma forma incontornável ao mais alto nível do desporto-rei. Se Eusébio bem o soube fazer ao seu jeito e no seu tempo, Ronaldo tornou-se o maior embaixador de Portugal pelo mundo fora. O reconhecimento pela atribuição da segunda Bola de Ouro é disso mesmo prova, mas vai muito mais além do seu génio de futebolista.  A valia da sua afirmação portuguesa tem sido bem expressa na forma como tem sabido gerir o seu sucesso dentro e fora das quatro linhas, a vestir a camisola do clube ou a envergar a da sua seleção. Esteve bem o Presidente da República ao atribuir o grau de Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique a “um cidadão português conhecido no mundo inteiro como nenhum outro”, tal como reconheceu. Tem estado e continuará sempre a estar bem Cristiano Ronaldo a rolar a bola nos pés, na certeza de que continuará a afirmar a imagem de Portugal no mundo.