NOMES QUE NÃO VAMOS ESQUECER EM 2015
Por cada ano que passa, nomes, factos e figuras ficam retidos na memória pelo protagonismo, para o bem ou para o mal, que imprimiram a determinado momento, localizado no espaço e no tempo. Se deles ficam memórias ou as suas ações arrastam ou arrastarão consequências futuras, a cada um de nós competirá julgar. Para a FRONTLINE estes nomes serão incontornáveis neste ano que entra, sem mérito ou desmérito para os muitos que ainda se venham a revelar.
Paulo Portas
O líder centrista poderá ser o calcanhar de Aquiles de Passos Coelho nas próximas legislativas. Estará Portas disponível para reeditar a coligação com o PSD? Queiramos ou não, a verdade é que o líder centrista é incontornável em qualquer solução de governação à direita dos socialistas, mas o contrário já não é necessariamente verdade, ou seja, que precise do PSD para chegar ao poder. Resta saber o que defende Paulo Portas para o seu futuro, que depende só de si, o que já não poderá afirmar o atual primeiro-ministro Passos Coelho. Também é sabido que as tensões na coligação continuam latentes e o desgaste político que a oposição vai tentar impor com o aproximar das eleições legislativas pode levar à rutura de alguns equilíbrios que muitos consideram precários, nomeadamente em matéria de política fiscal e social. Do lado oposto da barreira está assim Passos Coelho, e o desgaste político de quatro anos de governação provocado por um rigor de austeridade, que muitos clamam como não necessário, poderá seriamente comprometer a ambição política do primeiro- ministro, facto que certamente Portas levará em conta, até porque, na atual conjuntura política, parece não haver espaço para o PSD e centro-direita tentarem recuperar a confiança do eleitorado com base num novo projeto político para um Portugal alegadamente saído da crise. Passos terá ainda de enfrentar a escolha de um candidato presidencial quando a esquerda já leva avanço nas declaradas intenções de voto, a fazer fé em sondagens já divulgadas. Se todos os cenários são obviamente hipotéticos, mais ainda a esta distância das presidenciais, a verdade é que é sempre preferível estar associado a uma dinâmica de vitória do que de derrota. Mesmo com tudo isto, há que reconhecer a Passos Coelho uma inegável resiliência e uma enorme capacidade de regeneração política. Mas a verdade é que, como já o tínhamos afirmado no ano passado, 2015 será mais um ano de protagonismo de Paulo Portas, restando saber como o atual ministro de Estado vai conseguir gerir o capital político da figura ímpar em que se tornou na política portuguesa.
Para muitos é o rosto da desejada mudança numa Europa fustigada pela austeridade e cansada da inflexibilidade política de Merkel e dos alemães. Alexis Tsipras fez algo que a esmagadora maioria dos líderes europeus julgava impossível: levou a esquerda radical ao poder na Grécia, ficando na margem mínima de obter a maioria absoluta, problema que rapidamente resolveu numa aliança que ainda soou mais estranha, ao estender a mão a Panos Kammenos, líder de um partido de direita, com forte pendor nacionalista. A verdade é que Alexis Tsipras e a força política que encabeça, o Syryza, deixaram cair qualquer vínculo marcadamente ideológico e limitaram-se a capitalizar o descontentamento dos cidadãos gregos face à austeridade imposta pelo programa de resgate da União Europeia e Fundo Monetário Internacional. A Europa está apreensiva, mas Tsipras também tem clara consciência do difícil equilíbrio que tem de manter entre não defraudar as expetativas dos que o apoiaram e impedir que as portas do Velho Continente se fechem em definitivo para Atenas.
O governador do Banco Central Europeu tem-se vindo a assumir, também com algum protagonismo mediático, como uma das pedras basilares das desejadas mudanças da política económica no seio da União Europeia. A última decisão do BCE de lançar um programa de compra de dívida pública dos Estados-membros da UE, muito à semelhança do que foi feito tanto pela Reserva Federal como pelo Banco de Inglaterra, com sucesso refletido na recuperação económica de ambos os países, há muito que era desejado, sobretudo pelos países mais atingidos pela austeridade. Mario Draghi terá conseguido ultrapassar a inflexibilidade germânica com algumas cedências, mas a tenacidade desta decisão mostra uma verdade irrefutável: os que lideraram os programas de austeridade já só resistem até que a prova cabal do seu falhanço conheça luz no terreno. Aí serão obrigados à demissão, e a chanceler Angela Merkel disso já se apercebeu. Agora trata-se apenas de adiar o inevitável, até porque uma Europa próspera acarretará sempre mais problemas para os alemães. Uma certeza porém existe: as novas políticas reclamadas para uma Europa em declínio já não refletem a visão de Merkel para a consolidação de uma União Europeia e de uma moeda única.
Candidato ou não, a verdade é que o ainda Comissário para os Refugiados das Nações Unidas já condicionou as próximas eleições presidenciais, embora ainda estejamos a um ano de distância. Verdade ou não, mesmo que Guterres possa acalentar o sonho – politicamente improvável – de chegar a secretário-geral da ONU, o que hoje já sabemos sobre candidatos presidenciais pouco ou nada mudará. Marcelo Rebelo de Sousa, António Vitorino e Santana Lopes serão os protagonistas da próxima corrida a Belém. Mas também é verdade que para estes a corrida será sempre mais fácil do que para António Guterres, pois a excelente imagem e prestígio de que atualmente beneficia poderá não ser suficiente para apagar o rasto negativo do um passado ainda recente, quando, nas suas próprias palavras, abandonou o “pântano” em que se tinha transformado o país. Era na altura primeiro-ministro. O mesmo caminho trilhará Durão Barroso, pese embora alguns tentem lançar a sua candidatura a Belém. Mas Barroso certamente já terá percebido o que os portugueses não esquecem: que não perdoam a quem os abandona e ao seu país. Na verdade, o único facto que ressalta de um avanço prematuro, ainda que mediático, de Guterres à Presidência da República é criar um problema ao centro-esquerda político e particularmente a António Costa, numa altura em que a preocupação dominante é o combate pela vitória nas próximas legislativas, essas, sim, bem mais próximas do que muitos desejariam.
Figura de destaque em 2104, ano que marcou de uma forma meteórica a sua consolidação política – ao conseguir uma vitória sem precedentes na sua recondução à frente dos destinos da Câmara Municipal de Lisboa e ao conquistar a liderança dos socialistas, conseguindo uma mobilização sem precedentes na história do partido –, entra neste novo ano já consagrado como o futuro primeiro-ministro de Portugal. Se é verdade que não há vitórias antecipadas, também é verdade que no atual quadro político os ventos sopram favoráveis para que os homens do Largo do Rato consigam o pleno: vencer as legislativas e as presidenciais. Não significa isto que o caminho seja fácil para António Costa, mas se há virtude que lhe é reconhecida, é um raro sentido de oportunidade política. A Costa só lhe falta encontrar o equilíbrio entre as propostas que terá de apresentar para a recuperação económica e social do país, sem comprometer as medidas de austeridade ainda necessárias para não comprometer o futuro no médio prazo. Isto, se a sua aposta política tiver um horizonte temporal alargado que não se esgote no prazo de uma ou duas legislaturas. É que António Costa ainda tem muito futuro político pela frente, que se pode desenhar no médio e no longo prazo. Consiga o atual líder socialista equilibrar esta equação e Portugal será rosa, certamente por mais do que uma década. Algo que Passos Coelho foi manifestamente incapaz de compreender e, mais ainda com uma preciosa ajuda de Cavaco silva, acabou por comprometer o futuro, certamente também por mais do que uma década, do centro-direita em Portugal.
Quo vadis Francisco? Que a força avassaladora do novo Papa está a construir uma nova era de afirmação e evangelização da Igreja Católica no mundo é cada vez mais uma evidência que extravasa a própria Santa Igreja e, no bom sentido, contamina tudo e todos. Se em tempos houve dúvidas, hoje é claro que a Igreja Católica está determinada em acompanhar a dinâmica reformista de Francisco, a força da sua nova evangelização e da sua aproximação aos fiéis, rompendo em definitivo com um afastamento preocupante que dominou o prelado do seu antecessor alemão. Basta ver o que se passou na sua recente visita às Filipinas, onde, numa missa campal, foi consagrado por mais de 6 milhões de devotos. E ao mesmo tempo Francisco continua a surpreender na forma como, com uma simplicidade desconcertante, alicerça o seu discurso, seja na maneira como deixou claros avisos à Cúria, nas suas palavras de Ano Novo, seja como abordou a questão da “virtude da prudência” na liberdade de imprensa após os recentes atentados terroristas em Paris. Francisco é hoje o rosto de “humanização” da Igreja Católica, de um Papa que alicerça a sua ação num discurso de pastor, solidário, preocupado com quem sofre e carece de atenção e justiça, mas onde os constantes apelos à cultura do diálogo e à comunhão nas diferenças têm sido a sua marca de água.
Sem dúvida a mais mediática figura política dos últimos anos, José Sócrates parece cumprir o adágio popular de “bestial a besta”. Na verdade, o ex-primeiro-ministro continua a ser uma figura incontornável na sociedade portuguesa e protagonista de um aceso debate, não tanto por si, mas pelas implicações que a sua detenção e consequente prisão preventiva no Estabelecimento Prisional de Évora lançaram nos mais variados setores da sociedade portuguesa. Num país onde, a cada ano que passa, se agudizam as críticas ao mau funcionamento da Justiça, onde ainda prevalece a ideia, para muitos cidadãos, de uma justiça “para ricos e pobres”, onde se trocam aguerridas acusações sobre os perigos da judicialização da política e do poder da magistratura, onde a violação do segredo de justiça se tornou uma prática sistémica e impunível, a detenção, não só de um ex-primeiro-ministro acusado de corrupção, como do último primeiro-ministro em exercício, e portanto ainda muito vinculado à sua família política, abriu uma profunda fratura na sociedade portuguesa. Sócrates já não vale por si mas sim pelo caso que protagoniza, o qual, independentemente do seu desfecho, já mostrou quão frágil ainda é a democracia portuguesa.