FERNANDO SANTO

Simulador-de-Financiamento-imobiliárioA ESPECULAÇÃO E A BOLHA DE OPINIÕES SOBRE O MERCADO IMOBILIÁRIO

Nos últimos meses têm sido publicadas notícias e opiniões que procuram alertar para uma suposta bolha imobiliária, para a especulação, para o perigo do turismo em excesso e para o facto de não existirem nessas zonas rendas a preços acessíveis. Não deixa de ser curioso que tais opiniões são, em muitos casos, de quem pouco sabe de imobiliário ou de turismo, o que transparece nas afirmações proferidas, e raramente surgiu com soluções quando os sinais eram negativos, com as cidades a perder população e os edifícios a ficar em ruínas.

Foi com outro modelo, diferente daquele que atualmente é criticado, que cresceram as periferias que obrigaram os portugueses a endividar-se para comprar casa e a perder muitas horas diárias entre as suas residências e os locais de trabalho. Antes de criticarmos o que temos, devemos saber como chegámos aonde nos encontramos e nesse caminho a história é uma boa companhia. Na minha opinião há de facto especulação e uma bolha, mas de opiniões não fundamentadas e até alarmistas. O que se tem vindo a registar na atividade imobiliária de alguns bairros ou ruas de Lisboa e do Porto não poderá ser utilizado como referência para as restantes zonas das mesmas cidades e muito menos do país. Verifica-se uma enorme assimetria nos preços de venda de habitação, como nunca se registou, pois nalguns edifícios de Lisboa os preços têm atingido valores de venda superiores a 6 mil euros por metro quadrado, podendo até ultrapassar os 10 mil euros. Mas não podemos confundir casos excecionais com as restantes zonas de Lisboa e muito menos com a média dos preços de venda a nível nacional, que é de cerca de 1295 euros por metro quadrado. Segundo os últimos dados do “Confidencial Imobiliário”, o valor médio de venda de habitação na Área Metropolitana de Lisboa é de 1600 euros por metro quadrado enquanto na Área Metropolitana do Porto é de 1006 euros, sendo o valor mínimo de 673 euros por metro quadrado, atingido na zona Norte. Fazer querer que os preços de alguns imóveis em locais específicos transformaram o mercado imobiliário numa bolha ou que há especulação não faz muito sentido.

Reabilitação urbanaPortimao_edificio_Mabor_Paredes-e-troço-de-muralha_JG_1

Também passa a ideia de que a reabilitação urbana está com grande dinâmica, mais uma vez confundindo algumas zonas com o território nacional. De facto, essa dinâmica ainda está muito longe de ser a resposta às verdadeiras necessidades dos prédios degradados que necessitam de intervenção, consequência do congelamento das rendas associado a valores anuais de inflação superiores a 20% durante mais de 15 anos. Também se tem passado a mensagem de que nas cidades de Lisboa e Porto o investimento estrangeiro e o turismo estão a expulsar os habitantes levando à prática de preços inacessíveis para a maioria dos portugueses. Esquecem-se, ou nunca souberam, que este investimento surge nas zonas que durante as últimas quatro décadas foram progressivamente abandonadas pelos seus naturais habitantes, sem a mínima atração de investimento. Nos últimos 50 anos Lisboa perdeu 250 mil habitantes, ou seja, 1/3 da sua população, enquanto a população do país cresceu 20%, tendo passado de 8,7 milhões em 1960 para 10,5 milhões em 2011. Por outro lado, se até 1974 cerca de 50 % das habitações anualmente construídas se destinavam ao mercado de arrendamento, após 1974, e como consequência do ataque ao mercado de arrendamento, este deixou de existir tendo passado de 1,1 milhões de habitações em 1981 para menos de 800 mil em 2011, ou seja, menos de 20% do parque habitacional. As políticas públicas de habitação durante as últimas décadas do século XX conduziram os portugueses a duas opções, ou construir uma barraca por manifesta falta de meios, nomeadamente durante a década de 1980, ou pedir empréstimo para comprar habitação, o que levou as famílias a um elevado endividamento, superior a 110 mil milhões de euros.

CEF-dará-treinamento-a-corretores-de-imóveis-sobre-novas-modalidades-de-financiamento-imobiliárioEstado atual

A degradação dos prédios dos centros das principais cidades e o abandono das populações que não queriam residir nessas zonas foi o estado a que chegámos e o ponto de partida dos estrangeiros que decidiram dar valor ao que antes foi ignorado e até desprezado. Por isso, não podemos responsabilizar os seus investimentos, nem os devemos impedir, pois fazem parte da solução, e muito menos fazer como os cucos, aproveitar os ninhos feitos por outras aves para querer viver nessas zonas a preços da periferia ou com rendas sociais. Na minha opinião, este efeito de valorização de determinadas zonas e de se dar mais valor aos edifícios reabilitados provoca uma onda positiva que permitirá investimentos noutras áreas abandonadas e em locais que também fazem parte das cidades, mas que continuam como expectantes, a preços bem menores, alargando a oferta dirigida à capacidade financeira das famílias, tal como sucedeu com a restauração, em que o leque dos preços é enorme. Portugal precisa de um mercado de arrendamento muito mais dinâmico, que passe dos atuais 20% do parque habitacional para 40%, mas para que tal aconteça é necessário estabilidade na Lei do Arrendamento Urbano e na fiscalidade aplicada à construção e aos rendimentos prediais, como garantia da confiança dos investidores. Curiosamente, quem investe a pensar no mercado de arrendamento e na melhor rentabilidade, escolhe zonas de preços mais baixos, pois as taxas são maiores porque os preços de aquisição são bastante mais reduzidos. O arrendamento para fins turísticos é muito limitado e tem sido graças a ele que se reabilitaram muitas centenas de prédios que de outra forma continuariam abandonados, mesmo quando o preço era muito baixo.