JOSÉ CARIA

PERSONALIDADES DE 2018 – Nomes que não vamos esquecerA cada ano que passa, nomes, factos e figuras ficam retidos na nossa memória pelo protagonismo que conferiram a determinado momento, localizado no espaço e no tempo. Para a revista FRONTLINE, estes seis nomes serão incontornáveis neste ano que entra, sem mérito ou desmérito para os muitos que ainda se venham a revelar. 

 

Jair Bolsonaro – Ainda ninguém sabe ao certo para onde vai o maior país da América do Sul, com a eleição de Jair Bolsonaro para Presidente do Brasil. A verdade é que quase 58 milhões de brasileiros votaram no homem assumido de extrema-direita que agora vai governar um país que viveu nos últimos anos a sua maior crise económica e política, adensada por um clima de insegurança e criminalidade fora de controlo, onde só em 2017 foram assassinadas 63.880 pessoas. Aliás, esta questão acabou por ser uma das principais bandeiras da campanha de Bolsonaro, ele próprio vitima de um atentado durante a mesma, com a promessa de permitir a posse de armas de fogo para todos os cidadãos. O assunto gerou grande polémica, mas a verdade é que Bolsonaro nada mais fez do que pegar nos resultados de um referendo de 2005, em que os brasileiros aprovaram por maioria esta possibilidade, e anunciar a sua concretização. Se o clima ainda é de incerteza, também é verdade que muitos já reconhecem em Bolsonaro um presidente que pode tirar o país da crise em que vive mergulhado. Para tal muito terá contribuído a escolha do juiz Sérgio Moro, o ícone da luta anticorrupção, particularmente contra o partido do antigo presidente Lula da Silva, para ministro da Justiça. Outra aposta forte foi a escolha do economista neoliberal Paulo Guedes para liderar o Ministério da Economia. Mas, no limite, existe uma pergunta por responder: qual dos dois Bolsonaro(s) vai ser presidente? O que insinuava a execução dos seus adversários políticos ou o que apela à democracia e à liberdade? O tempo o dirá… 

Theresa May – A primeira-ministra britânica ficará na história como protagonista da maior cisão política na Europa pós-Segunda Guerra Mundial, com a intenção de o Reino Unido abandonar a União Europeia, ao mesmo tempo que a rejeição, pelo Parlamento de Sua Majestade, do acordo de saída, o denominado Brexit – a maior derrota parlamentar de um governo em 100 anos – abriu um caminho de incerteza para o futuro político do Reino Unido, muito para além da sua permanência ou não na UE. No rescaldo desta rejeição, Theresa May acabou por resistir a uma moção de censura contra o seu Governo apresentada pelo Partido Trabalhista na sequência do chumbo ao acordo, com 306 deputados a votarem a favor da moção e 325 contra, numa diferença de apenas 19 votos.  Mas o que ficou à vista de todo este episódio que se arrastou penosamente no tempo – independentemente da solução encontrada para o Brexit – foi a fragilidade e incapacidade política da atual primeira-ministra britânica e do seu Executivo, e como muitos analistas têm acentuado, a prioridade parece ter sido a manutenção no Poder a todo custo. O problema é que este “status político” não é hoje um caso isolado na Europa e as autoridades de Bruxelas, no seu perfil autoritário e punidor com que partiram para as negociações, não parecem estar a tirar as devidas ilações do vazio político em que a União Europeia se está a precipitar, sobretudo desde a crise financeira de 2008. 

Xi Jinping – O atual presidente chinês é o rosto visível da emergência da próxima grande potência mundial que pode mesmo relegar o papel dos Estados Unidos para segundo plano na esfera internacional. E os dois eixos estratégicos de atuação desta “nova China” estão bem definidos: domínio económico e comercial, com uma orientação de investimento em setores estratégicos, como é o caso do setor da energia, e em estratégias de acesso a mercados terceiros, Europa, África e América Latina, mas também revelando uma clara aposta em indústrias de maior procura nos mercados nacional e europeu; domínio técnico-científico, com a China já a desenvolver tecnologia de vanguarda e a afirmar-se em setores high tech, como o caso da indústria aeroespacial. Longe vão os tempos em que a China “copiava o Ocidente e fabricava mais barato”. Aliás, é relevante analisar, por exemplo, que a China é dos países com mais baixo investimento do PIB na área da Defesa, contrariando por exemplo os EUA, mas com mais foco no desenvolvimento científico e tecnológico. Outro exemplo relevante e que tem sido uma bandeira internacional de Xi Jinping é a iniciativa chinesa de investimento em infraestruturas, “Uma Faixa, Uma Rota”, que tem por objetivo estabelecer novas rotas comerciais com o Ocidente, projeto no qual Portugal está na linha da frente. Aliás, o próprio presidente chinês fez questão de o reafirmar na sua visita recente ao nosso país. 

Marcelo Rebelo de Sousa – Incontornável e marca indelével na política portuguesa, haverá agora e para sempre dois tempos, “antes de Marcelo e depois de Marcelo”. Na verdade, o que aqui dissemos há uns anos atrás – quando perguntámos que Presidente quereria o país que Marcelo fosse – é hoje verdade. Tínhamos a convicção de que esta seria a equação a que Marcelo Rebelo de Sousa atribuiria importância, para agrado ou desagrado dos políticos, dos partidos, das forças que gravitam à volta deste universo. E assim foi. Marcelo trouxe certamente tempos novos na sua relação com os eleitos e os eleitores, mais ainda depois do anterior mandato de um presidente do qual os portugueses se divorciaram. Para o bem ou para o mal, não é o país e os portugueses que passam pelo Presidente, mas é o Presidente que protagoniza por onde o país e os portugueses têm de passar, tanto aquém como além-fronteiras, conciliando o intocável sentido de Estado com a proximidade do conforto no infortúnio ou na desgraça. Assim como se soube impor na condução política do país quando as circunstâncias o exigiram; romper com interesses sempre que necessário; elogiar e criticar independentemente de credos, filiações ou convicções e, acima de tudo, estar ao lado dos portugueses quando a consciência assim o determinou. 

Augusto Santos Silva – Revelou-se o grande pilar político de António Costa e elemento fundamental na coesão governativa da “geringonça”, mas deve-lhe sobretudo ser reconhecido o mérito e o extraordinário desempenho que tem protagonizado à frente da pasta dos Negócios Estrangeiros, numa conduta discreta e de singeleza na política em Portugal. A sua ação, coordenada com a Presidência da República e apoiada na elevada e reconhecida competência da diplomacia portuguesa, tem dado um forte contributo à afirmação de Portugal nos mais variados domínios da política internacional, desde António Guterres na ONU a Mário Centeno na presidência do Eurogrupo. São ainda exemplo a consolidação da afirmação estratégica do país, como no caso das relações com a China – com a afirmação e reconhecimento pelas autoridades chinesas de Portugal como um parceiro estratégico de entrada não só na União Europeia, mas sobretudo no espaço da Lusofonia –, ou a gestão de dossiers complicados, como foi o caso do extremar de posições com Angola, por força do processo judicial contra Manuel Vicente, anterior vice-presidente daquele pais africano, com a posterior visita do presidente angolano a Portugal a espelhar o clima fraterno de recíproca cooperação desejada com as autoridades portuguesas. Pena que, no médio prazo, o futuro político de Augusto Santos Silva possa estar ligado à capacidade ou não de afirmação política de António Costa nas próximas legislativas de outubro.

Rui Rio – Se é verdade que no confronto liderado por Luís Montenegro, das vozes que se agudizaram contra o caminho errático que o PSD tem vindo a trilhar, Rui Rio saiu vencedor com a aprovação da sua moção de confiança no Conselho Nacional, não significa que a sua liderança tenha saído reforçada. O veredito cairá a 6 de outubro nas próximas eleições legislativas e, até lá, resta saber que caminho trilhará Rio e se o Partido Social Democrata terá capacidade de se afirmar como projeto político de poder para governar Portugal nos anos vindouros. Na realidade, desde que, em janeiro do ano passado, foi eleito presidente do PSD, Rui Rio não tem conhecido um caminho fácil. A primeira cisão que enfrentou foi logo a saída de Santana Lopes, o seu adversário, para formar um novo partido no mesmo espectro político, o centro-direita. Agora, o desafio à sua liderança protagonizado por Luís Montenegro foi mais contundente, e está por avaliar se Rio venceu ou sobreviveu. Para o bem ou para o mal, Rui Rio será figura incontornável neste ano de eleições, a começar já em maio com o Parlamento Europeu. É verdade que parece ter começado a alterar o seu discurso político para um tom mais incisivo, mas os críticos continuam a apontar o vazio de ideias e alternativas a Costa. Santana parece, mesmo assim, ter dado uma ajuda, quando situa a alternativa à “geringonça” numa recriação do modelo no seu bloco político, precisando para isso de um PSD forte, já que afastou a hipótese de uma coligação pré-eleitoral. Conseguirá Rui Rio fazer valer os seus créditos políticos, como bem provou quando governou durante 12 anos a Invicta? Já não lhe resta muito tempo e os amigos parecem também escassear.