OS ROSTOS DA FRONTLINE
Mais um ano cumprido, e mais 10 personalidades marcantes da nossa vida política, económica e social deram rosto à FRONTLINE. São testemunhos de pessoas, cujas ideias, projetos e paixões assumiram, na conjuntura em que foram produzidos, determinados significados que hoje provavelmente já poderão ter outra leitura, mas cujo efeito não se diluirá no tempo. Aqui ficam, em síntese, traços e afirmações expressas por todos eles nas suas entrevistas à nossa revista. As entrevistas completas estão disponíveis em www.revistafrontline.com
UM SNS QUE PERDURE NA RACIONALIDADE DAS ESCOLHAS
Assumidamente um homem pragmático, o atual secretário de Estado Adjunto do ministro da Saúde, Fernando Leal da Costa, acredita no serviço público e faz sua a defesa do SNS, defendendo ao mesmo tempo que, em áreas como a Saúde, o setor privado deve ter um papel complementar e não substitutivo. Médico de formação, afirma que nunca saiu do SNS e que o seu maior desafio de hoje é desenvolver políticas para garantir melhor saúde e para que a crise afete na menor dimensão possível os bons indicadores já alcançados: “Na verdade, apesar da austeridade e não obstante muitos considerarem impossível, há indicadores em melhoria contínua.” Quanto a um primeiro balanço do seu mandato, deixa bem claro que ainda há muito para fazer, considerando que “até agora foram anos muito exigentes, marcados pela necessidade, diria mesmo obrigação, de conter despesas e de melhorar a eficiência sem prejudicar a parte assistencial e o acesso”. Mas a afirmação de que o SNS continua a desempenhar o seu papel como referencial na prestação de cuidados de saúde em Portugal, de que o acesso aos cuidados tem vindo a crescer, as pessoas pagam globalmente menos pelas prestações de saúde e os mais desfavorecidos estão mais protegidos é também uma convicção que deixa transparecer nas suas palavras. Mesmo na panóplia de acusações que recaem sobre a sua tutela, como a do Ministério da Saúde ter sido mais “troikista” que a troika, Leal da Costa fundamenta bem as suas ações e decisões, lançando para o debate a discussão do que, noutras circunstâncias, poderá ter acontecido: “Não faz sentido, vem fora de tempo, ouvir aqueles que chamaram a troika, negociaram e assinaram o acordo, criticarem agora quem tudo fez para honrar esses compromissos. O êxito deste Governo é o êxito de Portugal. Teriam preferido ver um segundo resgate? Um SNS desfeito? Sugiro que se faça a pergunta inversa: o que teria acontecido ao SNS, e a quem dele mais precisa, se não fossem tomadas as medidas que foram tomadas? Acho que o mais importante foi termos introduzido racionalidade na decisão. Não se cortou ‘cegamente’, como afirma o discurso oposicionista.” E refere o que o SNS de hoje é o resultado do trabalho de governos sucessivos com uma orientação clara sobre o direito à proteção da saúde e que esta é uma área em que os portugueses teriam muito a ganhar se os partidos não comunistas, aqueles que têm uma visão democrática e humanista de um Estado solidário e plural, ultrapassassem diferenças para se concentrarem num entendimento e garantissem não haver retrocesso em nome de conveniências pessoais e de estratégias de conquista de poder.
A REDUÇÃO DE PROFESSORES FACE À NATALIDADE É INEVITÁVEL
Acérrimo defensor da melhoria da formação de professores, o atual ministro da Educação considera a qualificação e a qualidade dos docentes como um fator decisivo para a melhoria do sistema de ensino em Portugal. Apesar de se assumir como um grande defensor da avaliação, em todos os sentidos – de professores, alunos, escolas, manuais – foi obrigado a admitir que o sistema tem falhas mas não se esquivou a apontar soluções, como a introdução das provas finais nos 4.º e 6.º anos de escolaridade, uma prova de Inglês obrigatória, mas sem efeito necessário nas notas, e a prova de professores, que reconhece que foi muito polémica. E nesta matéria reforça a sua tese: “A avaliação do trabalho dos professores é fundamental. Conseguimos logo no início do nosso mandato resolver um diferendo antigo e que tinha inflamado muito os ânimos. Neste momento esta avaliação está a decorrer com normalidade e é um incentivo à melhoria de todos.” Para Nuno Crato é óbvio que os últimos anos foram difíceis na área da Educação, mas quando confrontado com a pergunta de “que escola pública vamos ter no pós-troika? Que modelo de gestão de educação quer deixar para o futuro?”, foi imperativo na sua resposta: “Eu não vejo que a escola pública seja diferente no pós-troika. Tivemos de fazer diversas poupanças durante este período de dificuldades que vivemos e que, em grande parte, vamos continuar a viver nos próximos anos. O caso mais gritante foi o atraso na requalificação de muitas escolas, mas aí também vamos não com luxos, mas de modo a atender às necessidades dos jovens e das escolas.” Quanto ao futuro, e sobre matérias como a qualidade do ensino que estamos a promover no ensino secundário, nas universidades e na preparação para o mundo do trabalho; quando se fala que Portugal precisa de mais engenheiros, mais médicos, mais cientistas e sobre os impactos da emigração destes mesmos profissionais, Crato considera que estamos ainda longe do que queremos, e que se pretende que a excelência se estenda a todos, mas há uma questão que não contorna: “Sabemos que há áreas em que existe mais facilidade em encontrar emprego do que outras, mas o nosso país continua a ter necessidade de técnicos, e, infelizmente, há muitos jovens que poderiam ter uma profissão técnica ou científica e que não prosseguem os estudos nessas áreas porque têm deficiências básicas a Matemática, a Português ou Física, disciplinas centrais. Daí a grande preocupação em que os jovens tenham uma formação nessas disciplinas que lhes permita fazer opções livres no futuro, nomeadamente a de seguirem uma carreira técnica ou científica.”
A MANEIRA PORTUGUESA DE ESTAR NO MUNDO
Figura emblemática do Estado Novo, após a revolução de 1974 tornou-se uma das personalidades de charneira do Centro Democrático Social (CDS) e um parlamentar dos mais respeitados. Jurista, político e professor universitário, Adriano Moreira ainda hoje é um dos pensadores de referência do nosso país. Embora tenha abandonado a política ativa em 1995, continuou a sua atividade nas áreas do ensino e da investigação, mantendo uma visão muito presente da evolução da sociedade portuguesa que sintetiza numa curta afirmação: “Há uma mudança que podemos e devemos considerar positiva: uma relação entre a vida habitual e o aceitar a mudança equilibrada com respeito recíproco. Grande parte da minha vida, sobretudo jovem, foi numa sociedade portuguesa que correspondia a uma sociedade de vida habitual, em que não era evidente o sentido de que há sempre uma dinâmica que acompanha a mudança. E isso foi aquilo que se tornou mais evidente com o 25 de Abril. Infelizmente, a evolução da Europa tem repercussões em Portugal e está a afetar um valor fundamental – que tem de ser avaliado e considerado nesta evolução entre a vida habitual e a vida que está atenta aos mecanismos da mudança – que é a circunstância de que aquilo que identifica, sobretudo, uma comunidade nacional é a comunidade de afetos.” E é nesta lógica que explica o que considera ser o maior perigo atual, o facto de o credo do mercado estar a tomar o lugar do credo dos valores, numa Europa em que os governos têm vindo a perder legitimidade, o que em certa medida explica a quebra de solidariedade no projeto europeu, mas alerta também para a necessidade de não se voltarem a cometer os mesmos erros: “Os governos têm dificuldade em compreender que há uma certa diferença entre legitimidade de aquisição do poder por votos e uma coisa cruel, que começa no dia seguinte à tomada de posse, que é a avaliação da coerência entre o que fazem e o que tinham prometido, a legitimidade de exercício.” Quanto à troika, Adriano Moreira voltou à referência de uma das suas frases emblemáticas, na sua crueza ao reafirmar que não gosta de ver ministros do seu país a falar com empregados daquela organização, entre outras referências cruas deixadas na sua entrevista, quer em relação ao seu antigo partido quer em relação à necessidade de surgirem novas forças partidárias em Portugal. Quanto ao futuro, já se obriga a algum recato, mas acredita que existem ainda duas janelas de liberdade e oportunidade neste país para as quais pode dar algum contributo: a CPLP e o mar.
NUNCA ESTEVE EM CAUSA A NOSSA SOBERANIA
Homem convicto, o atual secretário de Estado Adjunto e da Economia afirmou-se totalmente solidário com todas as medidas que foram tomadas pelo Governo de Passos Coelho. Na sua opinião, a decisão de uma “saída limpa” do programa da troika foi uma decisão pensada, ponderada e equilibrada, o que permitiu passar uma imagem de dupla confiança aos portugueses, quando hoje atingimos níveis historicamente baixos nas taxas de juro, retomámos a confiança dos investidores e foi desenvolvido um programa de reformas que demonstrou resultados e uma grande prudência na sua gestão. No entanto, à altura da sua entrevista à FRONTLINE, a realidade também mostrou faces diferentes quando houve uma grande penalização, por exemplo, nas eleições europeias, em que Leonardo Mathias descarta “uma penalização pelo povo: as eleições europeias não são eleições para eleger um governo e, na minha opinião, os responsáveis estiveram concentrados na visão europeia e não podemos, não queremos, nem vamos extrapolar para a ação governativa. Ficámos aquém das expectativas, é de reconhecer, a ambição era ganhar as eleições. Com certeza que ilações vão ser tiradas destes resultados, mas num plano europeu”. Como gestor também é um homem que não se sente limitado na sua ação pela máquina do Estado, considerando mesmo que, de forma alguma, esse enquadramento limita uma visão estratégica e um propósito de fazer algo, e o exemplo disso é a quantidade de medidas e de reformas que este Governo tem tomado e mais especificamente o Ministério da Economia: “Tal como referi, tanto a estratégia de Fomento e Crescimento Industrial – que tem datas e metas precisas – como a agenda para a competitividade do comércio, serviços e restauração – que também tem datas e metas específicas – demonstram que o facto de estar a trabalhar no Estado não limitou a minha atuação”. E as limitações impostas pela troika, mesmo considerando que houve uma “saída limpa” do programa de resgate? De que modo poderão condicionar a ação governativa? Também neste plano o secretário de Estado se mostra tranquilo ao considerar que, de certa forma, as ações nunca foram limitadas: “nós é que acordámos com a troika um certo número de medidas que tivemos de cumprir. Neste aspeto não há limitação, na medida em que combinámos com os credores quais é que eram as medidas que íamos implementar para tornar a nossa economia mais competitiva”. E quanto ao ganho de competitividade a opinião expressa também é convicta, começando logo na afirmação de que a nossa soberania nunca foi condicionada.
JÁ PASSÁMOS O CABO DAS TORMENTAS
Na sua entrevista à FRONTLINE, o atual coordenador permanente da Comissão Política Nacional e porta-voz do Partido Social Democrata assentou todo o seu discurso num tom otimista, deixando expressas três mensagens que nortearam as suas palavras: um balanço positivo dos três anos de governação do PSD, evidenciado obviamente pelos resultados alcançados; o papel do Presidente da República como o primeiro dos referenciais da estabilidade política do país e a preocupação com um afastamento generalizado dos portugueses da política e dos partidos. Retomando a questão do balanço dos três anos de governação do PSD, para Marco António Costa é óbvio que o balanço é positivo: “Há três anos atrás, o país estava isolado, sob o ponto de vista financeiro, era um país sem crédito externo, encontrava-se numa posição de pré-bancarrota e com uma profunda depressão económica e social, com perspetivas de piorar drasticamente. Nestes três anos foi possível inverter esse ciclo, construir uma nova realidade, como o comprovam os dados que hoje são possíveis de apresentar. 2014 é um ano de crescimento económico, de pelo menos 1,2%. 2015 será também um ano de crescimento superior a 1% – contamos que seja 1,5%. A nível do desemprego inverteu-se o ciclo de crescimento e em maio tivemos uma diminuição da taxa de desemprego de 2,6%, ou seja, muitas dezenas de milhares de portugueses, de maio de 2013 a maio de 2014, encontraram uma oportunidade de emprego e a taxa de emprego – também para contrariar a tese de imigração – cresceu de 60,1% para 62%, isto é, 1,9% de crescimento da taxa de emprego em período homólogo. Julgo que os resultados falam por si e a perspetiva que hoje os portugueses têm é de esperança.” O porta-voz do PSD afasta igualmente a ideia de que existam diferenças insanáveis na coligação e acredita que os portugueses não ficarão espantados se os dois partidos que governaram o país num momento tão delicado se apresentem coligados nas próximas eleições. Quanto às críticas, a cautela impera nas palavras, e se manifesta preocupação com o afastamento generalizado dos portugueses da política e dos partidos, também não deixa de apontar causas concretas para tal: “O que existe é um afastamento generalizado dos portugueses da política e dos partidos, e o que está a acontecer no PS não ajuda a gerar confiança nem a aproximar as pessoas. Sobre a vida interna do PS não faço nenhum comentário para além de pura análise factual.” Para o futuro, nas palavras expressas fica também a garantia de que o pior já passou: “Penso que o período mais difícil de toda esta governação está ultrapassado.”
É TEMPO DE PÔR MÃOS À OBRA
A reforma do trabalho portuário, a alteração do regime de concessões dos terminais portuários e do modelo de estrutura dos portos, a privatização do setor dos transportes, com destaque para a importância do setor ferroviário e a questão da privatização da TAP, foram as questões centrais que dominaram a entrevista do secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações à FRONTLINE. Mas Sérgio Silva Monteiro não quis deixar fugir a oportunidade de fazer também um balanço dos três anos de governação da coligação PSD/CDS, começando por afirmar que estão bem à vista os sucessos nacionais e internacionais alcançados: “fizemos o que nos era pedido, o programa de ajustamento foi concluído sem um segundo resgate ou extensão do prazo. Isto tem uma dimensão de ação determinada do Governo e uma dimensão de compreensão por parte dos portugueses, relativamente às medidas que foram tomadas. Esse sucesso pode ser medido nas taxas de juro da nossa dívida e na capacidade de Portugal voltar a ter acesso ao mercado de capitais, de ser conhecido internacionalmente como um país credível e com a sua reputação reposta”. Quanto a prioridades, nomeadamente nos Transportes, Infraestruturas e Comunicações, para o secretário de Estado é claro que a questão-chave passa pela implementação do Plano Estratégico definido, que tem como grandes vetores o desenvolvimento dos setores portuário e ferroviário. Na ferrovia, segundo as suas palavras, o que se pretende “é que a nossa exportação se faça com um transporte de mercadoria mais competitivo, seja através da eletrificação das linhas férreas, seja através do aumento da dimensão dos comboios, mas que permita que tenhamos mais carga nos nossos portos, aumentando assim a capacidade dos mesmos”. Já para os portos, Sérgio Silva Monteiro defende que é tempo de deixar de “ver os navios a passar”: “Somos o primeiro porto que as mercadorias encontram no movimento a partir do continente americano e somos um dos pontos de ligação mais competitivos quando se movimentam a partir do continente asiático, a caminho da Europa e do continente americano. Precisamos de criar condições para que eles escalem cada vez mais os nossos portos e que a economia beneficie com isso.” No entanto, reconhece que há ainda muito a fazer no setor portuário, nomeadamente em termos de investimento no aumento de capacidade dos portos e na revisão dos contratos de concessão atuais, porque alguns deles preveem cláusulas de exclusividade, limitando a existência de um segundo operador ou de um novo concorrente nesse mesmo porto.
VIVEMOS NUM ESTADO DE DIREITO IMPERFEITO
Com um currículo invejável, Fernando Negrão, o ex-diretor da Polícia Judiciária e hoje deputado do PSD, está igualmente à frente de uma comissão parlamentar alvo de um grande foco mediático por força da condução do inquérito à Gestão do BES e do Grupo Espírito Santo. Reconhecido pela sua imparcialidade e isenção, Negrão é também um homem acutilante nas palavras e reconhece que passar do palco onde se aplicam as leis para o palco onde as mesmas são feitas não foi “um processo fácil”, principalmente num país onde se fazem demasiadas e se vive atolado com a inércia existente na área da Justiça, porque há quase um século que a organização judiciária não era objeto de transformação: “Nós fazemos demasiadas leis em Portugal porque somos muito reativos. Acontece alguma coisa no país e a solução é, imediatamente, fazer uma lei. E se não se fizer a lei, todos nós sabemos qual é a reação… ‘não fizeram nada’. Então, muitas vezes para se fazer alguma coisa faz-se a lei, e isso está errado por dois motivos. Em primeiro lugar, porque não se deve ser reativo, porque quando se é reativo, as leis podem não ser as mais apropriadas. Em segundo lugar, as leis não saem com a qualidade com que deveriam sair porque o processo ou o problema não foi maturado.” E sobre a Justiça, a visão espelhada pelo deputado também não é muito otimista quando reconhece que ainda vivemos num Estado de direito imperfeito, e este Estado de direito imperfeito tem a ver com as dificuldades sentidas no que diz respeito à investigação criminal, aos próprios julgamentos e ao facto de nem a maioria da população ter ainda percebido realmente a importância da independência dos juízes e de muitas vezes o próprio sistema de justiça não estar devidamente organizado e não se auto-organizar de maneira a ser mais exigente relativamente à sua independência. Nesta lógica, a medida prioritária que defende para a Justiça é a defesa da reforma que está a ser levada a cabo por este Governo, nomeadamente no que respeita ao mapa judiciário. Reconhece na ministra da Justiça a coragem para levar a cabo esta reforma, bem como outras, nomeadamente a nível do processo civil e dos tribunais arbitrais: “Não direi que este é o projeto perfeito, mas esta é a reforma que a Justiça necessitava com mais urgência e que está a ser feita.” Quanto aos seus pares, admite que o perfil dos deputados tem mudado ao longo dos últimos anos, mas também o perfil de todas as pessoas nos vários setores da vida nacional: “Há aqui uma democratização da vida nacional, temos mais gente com muito mais qualidade, ao contrário do que acontecia anteriormente, em que tínhamos muito pouca gente, à qual atribuíamos toda a qualidade como se os outros não existissem.”
TENHO UM CONTRIBUTO A DAR AO PAÍS
É talvez um dos políticos com maior longevidade no ativo. Ministro dos Assuntos Sociais no tempo dos governos provisórios e, depois disso, ministro da Defesa, da Justiça e vice-primeiro-ministro no Governo do Bloco Central com Mário Soares, foi igualmente deputado durante quatro legislaturas e presidente da Fundação Luso-Americana durante 22 anos. Hoje Rui Machete ocupa a pasta dos Negócios Estrangeiros porque sentiu que tinha ainda “um contributo a dar ao país”. Num primeiro balanço da sua atuação, reconhece que foi um ano particularmente intenso: “Ao nível interno, foi decisiva a conclusão do PAEF [Programa de Assistência Económica e Financeira]. Recuperámos a nossa autonomia e reabilitámos a nossa credibilidade internacional. E isso é fundamental. Na nossa política externa, foi igualmente um ano muito estimulante. Tivemos várias concretizações ao nível diplomático, como as recentes eleições para o Conselho de Direitos Humanos e o Conselho Económico e Social da ONU, a copresidência e a reunião ministerial do Diálogo 5+5 realizada em Lisboa ou o início de uma nova etapa evolutiva na CPLP, que se afirma hoje como uma organização de dimensão mundial, promovendo a língua portuguesa no campo cultural e também no campo económico.” E muito mais haveria para dizer segundo as suas palavras. Quanto a prioridades, Rui Machete também é inequívoco quando afirma que devemos dar particular atenção ao que se está a passar no flanco sul da vizinhança da União Europeia e também à situação na Síria e no Iraque, a instabilidade na Líbia e o fenómeno do terrorismo e da criminalidade organizada comportam violações gritantes dos direitos humanos que importa combater. Já no âmbito bilateral, reforça o ministro, a prioridade é dar continuidade ao trabalho já desenvolvido na CPLP, na afirmação da sua dimensão económica, na ligação com o Mediterrâneo, no reforço do relacionamento transatlântico. Questão incontornável passava também pelas relações de Portugal com a Alemanha, e aí, sem surpresas, o discurso é alinhado com o do Governo: “A Alemanha assume-se como um dos motores da potência económica e política que é, hoje em dia, no sistema internacional, a União Europeia. Desse ponto de vista, o relacionamento bilateral que mantemos com um Estado da dimensão da Alemanha e com a influência positiva a que este é associado, no que se refere à definição das políticas europeias, não pode deixar de ser um aspeto importante da nossa política externa.”
A CULTURA É UM DESAFIO REPLETO DE ATRATIVOS
Para Jorge Barreto Xavier, o atual secretário de Estado da Cultura, esta, a cultura, sempre foi a sua forma de participação política, daí ter fundado o Clube Português de Artes e Ideias, que liderou durante 17 anos. A sua visão é inconformista quando afirma que vida política é a vida de qualquer cidadão que se envolve na sua sociedade: “Eu acho que todos temos o dever de ter uma vida política. Ou seja, não creio que a vida política seja, apenas, algo como ocupar um lugar de responsabilidade política, como é o caso do lugar que hoje ocupo. Esses lugares são momentos na vida das pessoas. A vida política, na minha perspetiva, não deve ser um momento na vida das pessoas, deve ser algo natural em nós. Julgo que é fundamental que, em geral, os cidadãos estejam envolvidos na vida política.” A cultura, encara-a como um desafio repleto de atrativos e reconhece que ser responsável por uma área governativa, num momento de grande dificuldade, é, por si só, um grande desafio. Mais ainda num Governo que tem uma das tarefas mais difíceis da história da democracia portuguesa, porque recebeu a responsabilidade de conduzir o Estado e a política nacional na sequência de uma quase falência, de uma quase bancarrota, e, obviamente, a tarefa ficou muito condicionada por circunstâncias e pelo contexto. A pergunta óbvia seria então, neste contexto, que medidas tinha conseguido implantar, ao que Jorge Barreto Xavier começa por afirmar que a sua primeira preocupação foi garantir a prestação do serviço público de cultura: “Depois de assumir a garantia da prestação desse serviço, pude desenvolvê-lo nos domínios que considerei prioritários. Nas várias áreas da minha responsabilidade – museus, bibliotecas, arquivos, património arqueológico, construído, móvel ou imaterial, na área da criação artística ou cinematográfica e audiovisual, nos direitos de autor, entre outras –, coisas concretas aconteceram. Em três anos de governação, e para lhe dar alguns exemplos, o Governo já investiu mais de 80 milhões de euros em reabilitação de património. Com a nova Lei do Cinema e do Audiovisual conseguiu-se o maior montante disponível, desde sempre, para a área dos apoios a estes setores. Por outro lado, há ainda que referir que este é o Governo que mais classificou o património cultural desde o início da I República, ou seja, o movimento de classificação do Património Cultural é o maior de sempre.” Sobre o futuro, Barreto Xavier destacou ainda as conclusões do estudo Augusto Mateus, realizado no âmbito do Plano Cultura 2020, onde claramente se aponta que a cultura pode contribuir ativamente para a internacionalização da economia portuguesa.
ESTAR PARADO NÃO É OPÇÃO
“A intervenção na inovação tem sido prioritária para o Governo português e para o Ministério da Economia em particular.” A frase pertence a Pedro Pereira Gonçalves, o secretário de Estado da Inovação, Investimento e Competitividade, reforçando a prioridade da sua ação nesta área, deixando bem clara a mensagem do caminho que considera que tem de ser seguido: “o desenvolvimento da economia portuguesa tem passado por um reforçar, muito claro, da produção e do investimento nos bens transacionáveis, bem como na procura de fomentar as nossas exportações. Ora, o crescimento, e o alimentar desse crescimento das nossas exportações, passa por duas variáveis muito relevantes: aumentar as exportações em volume, mas também em preço. No aumento do preço, a inovação é determinante. Nós só conseguiremos aumentar o valor dos produtos que vendemos, com mais inovação e mais valor acrescentado para o produto”. Uma pergunta recorrente passou pela avaliação da evolução das exportações em Portugal, evolução que o secretário de Estado considera surpreendente, acrescentando que um dos elementos mais relevantes deste processo de ajustamento foi, e tem sido, a capacidade de resiliência e de dinamismo das empresas perante uma diminuição drástica do mercado nacional e europeu, porque a crise sentiu-se muito ao nível da União Europeia e foi necessário procurar novos mercados. E conclui: “Perante esta situação, nós passámos – como é conhecido – de cerca de 28% do PIB em exportações para mais de 39%, com uma dinâmica de diversificação de setores e de mercados. Esse é um trabalho notável feito pelas nossas empresas.” Outra questão versada passou naturalmente pela atração do investimento, matéria sobre a qual Pedro Pereira Gonçalves foi inequívoco no elencar de medidas e metas atingidas, nomeadamente ao referir o novo código fiscal para o investimento, muito mais competitivo; o incremento ao nível de apoio às empresas que investem em Portugal, privilegiando quem investe na inovação e no desenvolvimento, quem emprega e quem investe no interior, e o trabalho que está a ser realizado na fase final de um eixo fundamental do apoio ao investimento, que é o Portugal 2020: “Depois, reduzimos as taxas de certificação em mais de um milhão de euros, por ano, para as empresas. Este tipo de medidas, que nos tornam mais simples, mais competitivos do ponto de vista fiscal e da qualificação dos nossos recursos humanos, torna-nos muito mais competitivos na capacidade de atrair investimento estrangeiro.”