ESPECIAL ANIVERSÁRIO

OS ROSTOS DA FRONTLINE

 

Mais um ano cumprido, e mais 10 personalidades marcantes da nossa vida política, económica e social deram rosto à FRONTLINE. São testemunhos de pessoas, cujas ideias, projetos e paixões assumiram, na conjuntura em que foram produzidos, determinados significados que hoje provavelmente já poderão ter outra leitura, mas cujo efeito não se diluirá no tempo. Aqui ficam, em síntese, traços e afirmações expressas por todos eles nas suas entrevistas à nossa revista.

 

PMSPEDRO MOTA SOARES

“Portugal não acautelou o futuro”

 

Ministro, ex-presidente da Juventude Centrista, hoje com a pasta da Solidariedade e da Segurança Social, abriu a sua entrevista à FRONTLINE com o mote do seu Governo, considerando que “Portugal não acautelou o futuro”, pois se o tivesse feito, “teria percebido que não nos podíamos manter num rumo em que o que gastávamos hoje não teria cabimento, sequer, com o que produzíamos amanhã”. Para o ministro é agora tempo de “resgatar esse mesmo futuro”, mas a sua resposta foi evasiva quando confrontado com a possibilidade de os portugueses serem capazes de suportar mais medidas de austeridade: “Julgo que a resposta à crise está, fundamentalmente, na redução do peso do Estado, numa transformação daquelas que são hoje as atribuições do Estado e numa mudança das suas responsabilidades. Uma reforma do Estado é desejável. Mais do que uma dieta, é preciso reformular o Estado, até para assegurar o modelo social europeu que desejamos manter.” Mas o tempo foi também de convicções e, citando o Papa Francisco, descreveu a forma como está na política, para servir. É assim para Pedro Mota Soares: “A política tem de ser um serviço e um compromisso. Um compromisso que assumi e em que, numa perspetiva de missão, me empenho francamente. Hoje estou ministro, não ‘sou’ ministro. Mas a atitude de serviço será sempre total.” Para os jovens, o recado não fugiu à linha do seu discurso político, afirmando que deverão agir em consonância, não cedendo às tentações das gerações anteriores e não desejando um Estado que nunca conseguirão suportar. “Só assim melhorarão o seu futuro e não deixarão para a geração seguinte a mesma herança que receberam.” E a partilha comungada com o primeiro-ministro de que 2014 será certamente um ano melhor também foi algo que quis deixar bem expresso: “É importante que o ajustamento tenha em consideração o esforço que o povo português tem vindo a assumir heroicamente e que, nesse sentido, possa acompanhar as necessidades promotoras da economia que permitam evitar a degradação de emprego. Só para dar um exemplo de áreas com que lido diretamente, a aposta na economia social pode muito bem ser um vetor para promover essa empregabilidade e esse crescimento. Hoje 5,5% do PIB, amanhã, quem sabe 10%, sem que no futuro se deslocalize o que garante a sustentabilidade económica de um país.”

 

ASSUNÇÃO CRISTASAC

“O Governo tem ainda muito para fazer”

          

Consciente das potencialidades do seu ministério, Assunção Cristas, na altura ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, considerou necessário que se continue a trilhar o caminho “de inovação, dinamismo, de trazer gente nova e bem preparada para a agricultura” e revelou os números que marcam a diferença: “no ano passado, quando infelizmente o nosso país teve uma recessão de 3%, o setor agroalimentar cresceu 2,8%”. No que toca ao mar, para a ministra, Portugal tem agora condições para se posicionar “na linha da frente sobre o enquadramento jurídico nesta matéria”, mas a nota que ressaltou da sua entrevista à FRONTLINE foi que o Governo tem ainda “muito para fazer”. O que se pode esperar então? Assunção Cristas não deixou margem para dúvidas: “Penso que podemos esperar ainda muito. O Governo tem governado em alturas extraordinariamente difíceis para o nosso país, mas tem um rumo claro, que passa por conseguir o equilíbrio entre cumprir os nossos compromissos internacionais, porque deles depende a nossa sustentabilidade enquanto país e enquanto economia, e, por outro lado, tentar favorecer o mais possível uma dinâmica de crescimento e investimento económico que possa gerar emprego, que neste momento é o nosso maior flagelo social.” Para a ministra é também evidente que a agricultura é uma das grandes respostas à crise que Portugal enfrenta, e sobre o que há ainda a fazer neste campo para que o país possa beneficiar verdadeiramente desta área, a sua linha de ação é clara: “Há que aprofundar o caminho que está a ser trilhado, de inovação, dinamismo, de trazer gente nova e bem preparada para a agricultura. Estes jovens que aparecem, cerca de 50% têm formação superior, o que é uma grande diferença se tivermos em conta que, em média, a idade dos agricultores em Portugal é de 63 anos e que grande parte nem sequer tem a instrução primária concluída. Trazendo pessoas mais novas, que possam beneficiar da experiência dos mais antigos, mas que têm outra forma de estar, outro dinamismo, e também outra visão de mercado, a agricultura portuguesa vai certamente destacar-se.” Uma última nota sobre as mulheres na política, que para assunção Cristas fazem sempre mais falta, até porque “o olhar feminino e o masculino têm muitas vezes sensibilidades e caraterísticas que são complementares e diversas”.

 

VBVÍTOR BENTO

“Revisão da Constituição? Sim e não”

                                  

Na análise que fez sobre a crise que estamos a viver, Vítor Bento, economista e membro do Conselho de Estado, acredita que “a forma como a Europa está a lidar com esta crise deixa ainda algumas coisas a desejar porque não é possível recuperar a economia com uma abordagem estruturalmente contracionista”. No caso de Portugal, acredita que temos de ter a “capacidade de conseguir competitividade na economia sem depender das bengalas da inflação e da desvalorização”, embora com consciência de que tal não vai acontecer facilmente, já que “o quadro mental de usar a inflação como escapatória para resolver as inconsistências das nossas escolhas continua muito presente nos decisores económicos e em muitos atores políticos”. Outro dos temas abordados na sua entrevista versou naturalmente a necessidade urgente ou não de se rever a Constituição. Para Vítor Bento a resposta não foi simples: “Sim e não, porque não há nada que se possa fazer alterando a Constituição para resolver as recentes recusas do Tribunal Constitucional, que são mais ideológicas do que jurídicas. Se virmos bem, estas decisões do Tribunal Constitucional que têm surgido ultimamente são tomadas não em função da letra da Constituição, mas através de interpretações subjetivas e ideologicamente marcadas de princípios filosóficos para os quais a Constituição remete. Esses princípios existem sempre e serão sempre interpretáveis com base no quadro filosófico de quem os interpreta. O problema está, se quiser, no quadro filosófico, não está na letra da Constituição.” Para Portugal os desafios também são muitos, quer do ponto de vista estrutural, na nossa forma de funcionamento compatível com os requisitos do sistema monetário do euro, que é um regime que está apontado para a estabilidade de preços, quer na correção dos desequilíbrios do passado, que lhe mereceu maior preocupação: “essa é a parte mais complicada, porque, entre outras coisas, nós não temos todos os instrumentos disponíveis. Por exemplo, o facto de nos faltar o instrumento de desvalorização da moeda torna mais difícil fazer o ajustamento necessário e corrigir o desequilíbrio externo”. Quanto ao desemprego, Vítor Bento também deixou um alerta crítico de que é um problema europeu, e que uma das principais razões que têm contribuído para o seu aumento é precisamente “o ajustamento que está a ser feito, pois é excessivamente assimétrico, na medida em que é exigido que seja feito apenas pelos países deficitários, em termos de contas externas, sem que os países excedentários cumpram a sua parte, que é dinamizar as suas economias”.

 

PMPAULO MACEDO

“A Saúde precisa de uma boa gestão”

 

Reconhecido como um dos maiores responsáveis pela modernização e informatização da máquina fiscal, hoje ministro da Saúde e considerado o governante mais popular e com mais credibilidade deste Executivo, Paulo Macedo revelou na sua entrevista a preocupação em cumprir os objetivos do memorando da troika e, em simultâneo, melhorar os indicadores de Saúde, mas mostrou-se orgulhoso em poder afirmar que “o Serviço Nacional de Saúde continua a dar resposta aos portugueses de forma equitativa, sem prejuízo da cobertura universal, em muitos casos com ganhos de saúde, mesmo num contexto de dificuldades, com o país a ser sujeito a uma intervenção externa, com diminuição de soberania orçamental que nos exige austeridade”. Para o ministro é hoje evidente que a Saúde em Portugal estava a precisar de uma boa gestão, mas não só: “O SNS, apesar de todo o esforço que foi feito anteriormente, carecia de foco e de um conjunto de instrumentos adicionais indispensáveis à boa gestão dos dinheiros públicos. Uma gestão mais transparente, rigorosa e eficiente. A transparência na gestão, a par da qualidade e sustentabilidade, é dos pilares mais importantes do SNS que estamos a construir. As administrações dos hospitais têm dado passos significativos numa gestão mais eficaz. Temos hoje gestores reconhecidos, ao nível do que de melhor se faz, no público e no privado, em Portugal e no estrangeiro.” Quanto ao futuro e do que gostaria de ver cumprido na sua legislatura, a resposta do ministro é pronta e inequívoca: “vamo-nos concentrar na redução da carga da doença, apostando fortemente na saúde pública, aproximando os cuidados de saúde dos cidadãos e reforçando os cuidados primários e continuados. Por outro lado, continuaremos a reforma hospitalar e a reforma da política do medicamento, e investiremos na excelência do conhecimento e na inovação, procurando criar as condições de contexto que potenciem a capacidade e a consolidação do conhecimento existente, em três domínios prioritários: investigação e desenvolvimento, excelência de cuidados e excelência na gestão da informação. A nível da gestão, caminharemos para a separação do financiamento da prestação de cuidados”. E a concluir, Paulo Macedo afastou as vozes pessimistas de que o SNS está em risco, considerando que hoje o Serviço Nacional de Saúde alcançou um elevado patamar em diversos indicadores, sendo a sua evolução das mais positivas nas últimas décadas, conseguindo “dar respostas, sem paralelo na nossa história, em que portugueses sem carreiras contributivas, rurais, pessoas sem posses económicas, com deficiência, imigrantes ou desempregados passaram a ter acesso à saúde”.

 

AMNADOLFO MESQUITA NUNES

“O Estado ainda dificulta o Turismo”

               

O secretário de Estado do Turismo do Governo de Pedro Passos Coelho conta já com uma grande experiência política graças aos muitos cargos que já desempenhou neste âmbito. Na sua entrevista à FRONTLINE fez um balanço positivo dos seus quatro meses de governação, afirmando que continuava a seguir os “eixos que definiu para o seu mandato, mas sem dúvidas de que há ainda muito para fazer”. Seguro de que a crise económica com que nos deparamos não atingiu ainda o setor do Turismo, considerou que o crescimento das receitas em 2011, de 7%, e em 2012, de mais de 5%, era um bom indicador para o futuro. Questão central foi naturalmente a das reformas necessárias para o setor, que Mesquita Nunes sintetizou em três eixos fundamentais: “Dentro do eixo de retirar o Estado da vida das empresas, temos de rever o regime jurídico de empreendimentos turísticos, de alterar a forma de funcionamento do Turismo de Portugal, de modificar vários regulamentos que interferem com a animação turística e com a fruição do espaço marítimo. No eixo do financiamento, vamos trabalhar agora no sentido do empreendedorismo na área do Turismo, ou seja, desviar os recursos da construção para a requalificação e para o empreendedorismo na animação turística, porque já temos oferta hoteleira suficiente, que não carece agora de mecanismos de financiamento. Na área da promoção, queremos apresentar novos instrumentos, mais ágeis, que permitam segmentar a mensagem e atuar mais rapidamente.” Quanto às restrições orçamentais, o secretário de Estado expressou a sua convicção de que a redução de custos que está a ser feita é positiva, “não só porque estamos a reduzir mas também porque estamos a tornar o modelo de promoção mais ágil, estamos a poupar na organização da administração, na organização regional do Turismo. Depois há que alterar os mecanismos de financiamento, torná-los menos pesados, úteis, mais acesso a menos recursos.” Promoção que acaba por ser também um aspeto fundamental no setor, mas onde Mesquita Nunes apresentou já um caminho traçado: “Portugal tem uma enorme diversidade concentrada num pequeno território e por isso temos de ter várias linguagens. Uma comum, que tem a ver com a imagem que Portugal quer projetar de si, como um país moderno, europeu, de qualidade, seguro, com diversidade, onde as pessoas sabem receber. Esta terá de ser a mensagem geral e comum. Depois há que segmentar a nossa mensagem conforme os mercados e os produtos que queremos promover.”

 

CNMCARLOS DAS NEVES MARTINS

“Temos um dos melhores SNS do mundo”

     

É, desde fevereiro de 2013, o presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN), e na sua opinião é necessário “adequar os recursos financeiros, humanos, tecnológicos e as infraestruturas que constituem a oferta à procura atual e futura, bem como procurar novas receitas próprias”. Graças a todos os esforços feitos pela sua equipa, o CHLN foi das poucas unidades hospitalares do país que conseguiram reduzir os seus custos operacionais nos primeiros oito meses do corrente ano, como deixou bem vincado na sua entrevista à FRONTLINE. As prioridades do presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte também estão bem definidas e, segundo as suas palavras, centram-se na organização da instituição, na produção clínica e na sustentabilidade financeira do CHLN: “Sobretudo esta última, dado que podemos ter uma moderna organização e uma excelente produção, mas ambas só terão sucesso se existir saúde financeira na instituição e esta é garantida por medidas integradas, por forma a assegurar equilíbrio entre a administração, em sentido lato, e a gestão clínica, a essência da nossa existência ao serviço das pessoas. No entanto, temos indicadores que nos permitem afirmar que teremos resultados diferentes já este ano, mas sobretudo ao longo de 2014 e no terminus de 2015. Como é fácil deduzir, em sete meses fizemos alguns rápidos diagnósticos e tomámos muitas decisões, mas muitas delas só terão impacto visível a médio e longo prazo.” Quanto ao futuro da Saúde em Portugal, Carlos Neves Martins deixou o alerta: “A situação de emergência do país e do SNS determina uma nova cultura de transparência na gestão de qualidade e de sustentabilidade do setor da Saúde. De facto temos um dos melhores serviços nacionais de saúde do mundo, pelo que nos dias de hoje urge manter a qualidade da nossa capacidade instalada em termos tecnológicos, de infraestruturas e de recursos humanos, assim como a reconhecida elevada excelência das nossas escolas de ensino/formação em saúde e dos nossos centros de investigação. Portanto, é fundamental implementar medidas de rigor no uso dos recursos à disposição da saúde, por forma a não haver reduções administrativas na assistência às populações, com custos sociais intangíveis, mas sim medidas que garantam efetivamente a sustentabilidade     do SNS.”

 

 

MPMMIGUEL POIARES MADURO

“Temos toda a legitimidade política e democrática”

         

Para o ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, o que mais o surpreendeu no desempenho das suas funções, como revelou na sua entrevista à FRONTLINE, foi “o ruído mediático muito elevado e uma relação de proximidade, talvez excessiva, entre o mundo político e o jornalístico, que se torna difícil de gerir, pouco transparente e conducente a um discurso público não necessariamente centrado naquilo que realmente interessa às pessoas”. Afirmando, sem pudores, que este mandato está a ser exercido “num período particularmente difícil da nossa história”, Poiares Maduro não tem dúvidas de que o Governo levará o mandato até ao fim, uma vez que tem toda a legitimidade política e democrática para isso. Questão sensível foi a que diz respeito à comunicação do Governo, para um ministro que vinha com o objetivo de a melhorar mas que continua a ser alvo de pesadas críticas. Mesmo assim, Poiares Maduro não se deixou intimidar, revelando que, neste contexto – num país sob resgate e em que o Governo está obrigado a aplicar medidas que impõem importantes sacrifícios aos portugueses, logo, a comunicação nunca seria fácil –, a sua preocupação “passa por prestar mais atenção, em matéria de coordenação política, aos processos de coordenação e preparação de políticas públicas e à promoção de instrumentos de proximidade e transparência na relação com os cidadãos”. Sob a possibilidade de um segundo resgate, o ministro não foi conclusivo, refugiando-se no Orçamento de 2014: “Este orçamento cumpre com as nossas obrigações internacionais, reforça a nossa credibilidade internacional e permite concluir o Programa de Assistência Económica e Financeira. É isso que justifica os sacrifícios feitos pelos portugueses. Sendo que tudo isto não é um fim em si mesmo, mas sim um instrumento para regressar ao crescimento económico e melhorar, mas de forma sustentada, o nível e qualidade de vida dos portugueses.” Área sensível mas também muito mediática na sua ação tem sido a questão da restruturação da televisão pública e do seu modelo de financiamento. Poiares Maduro, que afirma manter uma relação “cordial e franca” com Alberto da Ponte, presidente da RTP, fala em transparência e num financiamento suficiente para serem cumpridos os objetivos: “ No próximo ano a RTP deixará de receber a indemnização compensatória e passará a ser unicamente financiada publicamente pela CAV (Contribuição para o Audiovisual), que é uma forma mais transparente de financiamento. O financiamento público será menor do que este ano, mas o suficiente e necessário para a RTP cumprir os objetivos ambiciosos do novo contrato de concessão do serviço público.”

 

 

RAROGÉRIO ALVES

“As pessoas devem envolver-se na política”

        

Para o mais mediático dos bastonários que a Ordem dos Advogados teve até hoje, o lema de vida é simples: “procurar sempre ser inteligente sem ter medo de ser autêntico”. Consciente de que tem uma profissão nobre, capaz de mudar a vida de muitas pessoas, Rogério Alves não estranhou que se tenham apresentado seis candidatos nas últimas eleições para o cargo que já ocupou, considerando que representa “uma manifestação de cidadania e empenhamento”. Preocupado com o atual estado do país, acredita, mesmo assim, que é possível mudar o nosso rumo, com a aposta em novos partidos, com ideais e ideias novas. Já com a nova bastonária eleita à altura da sua entrevista, o confronto foi inevitável quanto à sua opinião sobre Elina Fraga, mas Rogério Alves não deixou questões em aberto nem críticas por tecer: “O anúncio confessado de persistir num quadro de continuidade não é, para mim, muito promissor. Nestes últimos anos os advogados perderam muito mais do que ganharam e, por causa disso, a cidadania sofreu escoriações, significativas. A Ordem foi totalmente incapaz de influenciar as alterações legislativas, que ocorreram como se ela, Ordem, e os advogados não existissem. Se a continuidade corresponder à continuação de uma panóplia de conflitos, como aquela que tem vindo a ter lugar, não pressagia grande coisa. As árvores conhecem-se pelos frutos e, sinceramente, o que frutificou, para a justiça, a cidadania e os advogados nestes últimos anos, não é, em minha opinião, nem saudável nem brilhante.” Na mesma lógica prosseguiu a sua análise aos mandatos do anterior bastonário, Marinho e Pinto, com quem mantém uma boa relação pessoal: “Percebo alguns combates que ele empreendeu, mas creio que muitas das opções com as quais ele fez grande finca-pé e com as quais fez apostas estratégicas relevantes, não foram as mais adequadas. A Ordem dos Advogados desafiou quase toda a gente para o combate e na verdade perdeu os combates quase todos, esta é que é a verdade.” Quanto à ministra da Justiça, considerou que as coisas mudaram pouco, expressando um ponto de vista negativo quando ao fim de dois anos se constata que praticamente não houve reformas, mas sim “uma preocupação de cumprir os objetivos do Memorando de Entendimento, no que diz respeito às famigeradas pendências, o que não se conseguiu”. Para os cidadãos ficou ainda uma mensagem: “As pessoas devem envolver-se na política numa perspetiva de construção de uma alternativa que terá de ser descoberta.”

 

LASLUÍS DE ALMEIDA SAMPAIO

“Os alemães respeitam Portugal”

               

Ciente de que o futuro dos portugueses está nas nossas mãos, Luís de Almeida Sampaio, o embaixador de Portugal na Alemanha, acredita que o seu trabalho tem contribuído para que a “imagem positiva” que os alemães têm dos portugueses se mantenha e, tal como revelou na sua entrevista à FRONTLINE, “os interlocutores alemães sabem que Portugal vai vencer, vai ultrapassar as dificuldades do momento presente, vai sair da crise com uma economia mais robusta e competitiva e simultaneamente dar um contributo importante para o aprofundamento da integração europeia”. Para Luís de Almeida Sampaio é fundamental contrariar ideias, pois os portugueses não são vistos na Alemanha “como preguiçosos ou irresponsáveis”, mas, pelo contrário, “como um povo muito sério e muito trabalhador”. Por isso mesmo não tem dúvidas sobre a nossa capacidade de ultrapassar esta crise, cujo futuro está só nas mãos dos portugueses, de um povo antigo que já viveu muito e superou outras crises e dificuldades, e está coletivamente a demonstrar a sua determinação e capacidade em novamente vencer: “Já estamos a sair do ‘buraco’ económico. Nunca tive dúvidas de que Portugal, enfrentando com seriedade as exigências impostas pela superação da crise e por um rigoroso programa de ajustamento económico e financeiro, iria vencer. E, é importante sublinhá-lo, os nossos amigos alemães também não. A retoma está aí. Os seus primeiros sinais são já visíveis.” Quando confrontado com o balanço da sua atuação enquanto embaixador de Portugal na Alemanha num período particularmente difícil, Luís de Almeida Sampaio reforçou a preocupação de valorizar o esforço coletivo que os portugueses têm feito para superar a crise económica e financeira e, por essa via, fazer de Portugal a história de sucesso de que a União Europeia e a Alemanha tanto precisam, com a ajuda de ser num país onde a comunidade portuguesa, composta por aproximadamente 120 mil pessoas, é bem vista e respeitada, integrada e vive sem problemas. Defensor da Diplomacia Económica, considera que é fundamental colocar no centro da nossa atividade diplomática a proteção dos interesses económicos portugueses e a promoção das nossas empresas, bens e serviços: “O tempo que vivemos, o mundo global em que operam as empresas, está profundamente marcado pela atividade económica. ‘We live in financial times’.”

 

PLANTÓNIO PIRES DE LIMA

“O tempo do populismo acabou”

              

O atual ministro da Economia não tem dúvidas de que “governar é diferente de gerir uma empresa”, não deixou de manifestar o seu orgulho por ter entrado para o Governo “num momento tão delicado e exigente”, mas também deixou claro que não está disponível para continuar caso a coligação vença as próximas eleições legislativas: “a minha missão tem um princípio, um meio e um fim: o princípio foi a crise de julho, o meio é a saída do resgate a 17 de maio, o fim será nas próximas legislativas”. A sua entrevista à FRONTLINE aconteceu numa altura em que a economia portuguesa começa a crescer – e a dar provas disso – e o desemprego a descer, pelo que o ministro reconheceu que o ambiente de confiança “melhorou e estamos a assistir a uma nova vaga de empreendedorismo”. Mas tal não afasta o reconhecimento do constrangimento ao crescimento das empresas e da economia portuguesa que o ministro sintetizou em poucas palavras: “Para além da recuperação do investimento privado é relevante melhorar o acesso e o custo do financiamento, nomeadamente às pequenas e médias empresas que sejam projetos viáveis. Isso passa por monitorizar e criar novos instrumentos de crédito para as PME, mas também por criar mecanismos que permitam uma melhor capitalização do tecido empresarial português. Espero que o novo banco de fomento tenha um papel relevante na agenda da capitalização das PME.” Quanto às expetativas para 2014, Pires de Lima já não foi parco em palavras ao afirmar que quanto à retoma económica podemos até vir a crescer mais do que o previsto no Orçamento do Estado: “A maioria dos indicadores mostra que os agentes económicos estão a ganhar cada vez mais confiança e que os sinais positivos da economia deixam adivinhar uma trajetória de crescimento. Mas atenção, a nossa prioridade deve passar por garantir que esta retoma assente em novas premissas que promovam um crescimento sólido, duradouro e que assegure a competitividade da nossa economia, num contexto cada vez mais concorrencial e competitivo. Não queremos, com certeza, reviver a experiência de termos um crescimento alicerçado numa lógica de endividamento excessivo, com pouco valor acrescentado e fraca componente tecnológica.” E no que respeita ao fim do programa de assistência, marcado para maio, Pires de Lima foi lacónico ao afirmar que o Governo optará pela saída que melhor sirva o interesse nacional. Mas sem deixar uma séria advertência no ar: “O tempo do populismo e da irresponsabilidade financeira acabou.”