RITA BOTELHO DOS SANTOS

ESTREITAR RELAÇÕES.

Em entrevista à revista FRONTLINE, Rita Botelho dos Santos, secretária-geral adjunta do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Fórum Macau) e coordenadora do Gabinete de Apoio ao Secretariado Permanente do mesmo fórum, revela,  que a China e os países lusófonos são uma “família” que se uniu há oito anos. Consciente de que se trata de duas realidades muito diferentes, afirma que é necessário “estreitar relações” de modo a que a cooperação económica e comercial, entre os vários países, se venha a consolidar. Não tem dúvidas de que há ainda muito para fazer nos próximos anos, mas para Rita Botelho dos Santos, o facto de existir um idioma em comum é algo muito positive e que, consequentemente, facilita todo o trabalho que tem de ser desenvolvido.

 

Quem é Rita Botelho dos Santos? Qual foi o seu percurso profissional até aqui?

Eu sou lusodescendente, nasci em Macau. O meu avô paterno era de Abrantes, o meu avô materno era dos Açores e as minhas duas avós, uma era chinesa de Singapura e a outra era do interior da China. Sempre estudei Português e tirei o meu curso superior de Gestão de Empresas em Portugal. Depois, voltei a Macau porque tinha um compromisso com o governo de Administração Portuguesa para aí trabalhar durante cinco anos, após o curso. Eu e o meu marido, que também é lusodescendente, casámos em Portugal. Ainda me lembro de lhe dizer que iríamos trabalhar os cinco anos em Macau e que depois regressaríamos, mas acabámos por ficar, por causa da família. Comecei a trabalhar muito cedo, com sete anos, porque éramos uma família muito grande e pobre. Ao longo dos meus 32 anos de serviço na função pública, orgulho-me de afirmar que consegui sempre grande apoio por parte dos governos, em especial do de Administração Portuguesa. De todas as funções que desempenhei, o cargo de que gosto mais é o atual, onde comecei a trabalhar em 2003.

 

Como define as relações entre Portugal e China em termos económicos, políticos e culturais?

Foi através da criação do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Fórum Macau) que a China conseguiu estreitar, cada vez mais, as relações com Portugal e com os outros países de expressão portuguesa, isto porque a China sabe que Macau tem uma ligação muito forte com Portugal. Temos uma grande comunidade portuguesa em Macau, muitos acabaram por ficar após a entrega do território à República Popular da China, que ocorreu em 20 de dezembro de 1999. A China acarinha muito Macau, e também Portugal, porque quer que a região desempenhe esse papel de ligação económica, social e cultural, que permitirá estreitar relações com empresários chineses e portugueses. Outra das áreas que devemos explorar é a investigação, especialmente na área da saúde.

Quando foi convidada para ser a coordenadora do Gabinete de Apoio ao Fórum Macau, ponderou não aceitar. Porquê?

Na altura hesitei porque achei que era algo abstrato. Mas quando assinaram o Plano de Ação, eu e a minha família ficámos muito felizes, porque esta era mais uma esperança para os portugueses e para os lusodescendentes. Desta forma, Macau não iria deixar de usar a língua portuguesa. Não tenho dúvidas de que o Fórum garantiu a nossa presence em Macau.

 

Hoje, como se sente neste cargo?

Totalmente realizada e acarinhada pelos portugueses e por todos os países de língua portuguesa. Acho que ainda posso fazer mais, com o apoio de toda a comunidade de Macau e dos portugueses, de modo a estreitar cada vez mais estas relações.

 

É um dos rostos mais conhecidos do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Quais foram as principais dificuldades que sentiu?

No início foi mais o facto de todos os outros países não perceberem como é que Macau, uma região tão pequena, os podia ajudar. Fomos fazendo a promoção e dando a conhecer o facto de que, através de Macau, as portas estão abertas para o grande mercado da China. Mas à medida que os empresários começaram a participar nas diversas atividades promovidas pela República Popular da China, perceberam que Macau, tendo a escola portuguesa e um vasto grupo de empresários e pessoas que dominam as duas línguas, facilita todas as operações.

 

Está satisfeita com a reação e a dinâmica dos agentes económicos dos países lusófonos?

Sim, ainda hoje recebi o contacto de dois grupos brasileiros que querem ir à China, através de Macau. Temos feito também contactos com grupos portugueses, nomeadamente na Feira Internacional de Cantão. Outra das novidades é o facto de os jovens terem também interesse em contactar connosco, especialmente no que se refere à área da alta tecnologia.

 

Como está a ser a cooperação entre Macau, Portugal, China e o espaço da Lusofonia Global?

Eu acho que Portugal tem um papel preponderante na ligação entre Macau e os Países de Língua Portuguesa, porque falamos a mesma língua e, para além disso, temos uma cultura comum, acabamos por conseguir concretizar os contactos mais facilmente.

 

Um dos pontos do Plano de Ação do Fórum Macau diz respeito à cooperação na agricultura e pescas. O que foi feito até agora nesse campo? Quais são os projetos para o futuro?

Depois da terceira Conferência Ministerial, foram anunciadas seis medidas aos Países de Língua Portuguesa em África (Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné-Bissau) e na Ásia, que visam dar apoio financeiro a um projeto de cooperação na área da agricultura. Esta cooperação está a ser feita e Macau está a acompanhar um projeto com empresários do interior da China, de Macau e de Angola.

 

Quais são os passos necessários para que o Fórum Macau tenha mais resultados práticos?

Precisamos da ajuda de Portugal para que exista mais divulgação. Queremos também promover Portugal no interior da China, principalmente para mostrar aos empresários quais os produtos que podem ser postos no mercado. Gostaria de salientar que, na China, muitos dos jovens empresários estão à procura de produtos de imagem, de marca. De cada vez que venho a Portugal, levo também os nossos produtos naturais para que os empresários os possam conhecer, que são de ótima qualidade. Sugeri ainda desenvolver relações com os operadores de viagens, porque Portugal assinou o acordo de Cooperação Turística e revela-se um excelente destino turístico para os chineses. Mas, para tal, é necessário que exista uma maior simplificação em termos de entregas de vistos.

 

Qual o balanço que faz da sua visita a Portugal?

Muito positivo, não esperava que fosse tão positivo.

 

O que representou para si a condecoração do Presidente da República?

Foi uma grande honra e uma grande satisfação, não só para mim como para a minha família. Valeu a pena ter tirado o curso em Portugal. Depois de mais de 30 anos, o meu contributo foi reconhecido, facto que agradeço.