PORTUGAL NO PÓS-TROIKA

_EDG9076_PAG 19ACORDO POLÍTICO SERIA O MELHOR PROGRAMA CAUTELAR

Eduardo Catroga aponta os riscos que ainda se colocam a Portugal no período pós-troika e defende uma “carta de conforto forte” por parte dos parceiros externos.

“O melhor programa cautelar para o período pós-troika deveria ser um acordo entre todas as forças políticas que subscreveram” o Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) – ou seja, PSD, CDS e PS – e que se “estendesse até ao final da próxima legislatura”. Essa seria, segundo Eduardo Catroga, ex-ministro das Finanças, a melhor forma de Portugal fazer face aos desafios que se avizinham neste período pós-troika em que agora entramos. Mas não o sendo, o melhor talvez tivesse sido garantir um programa cautelar “na versão leve ou, no mínimo, uma carta de conforto forte dos nossos parceiros europeus”. Uma espécie de “rede de segurança” que tranquilizasse os mercados financeiros a que Portugal recorrerá a partir de agora sem apoio para financiar a sua dívida e o seu défice. Os desafios neste período pós-troika são grandes e o fim do PAEF tem que ser visto como “o fim do princípio” de um novo padrão de gestão das finanças públicas e de crescimento e financiamento da economia portuguesa. O ex-ministro alerta que o saldo orçamental primário tem que começar a ser positivo já em 2014 para suportar o cenário de sustentabilidade da dívida pública. O rigor orçamental continua a ser essencial e é fundamental uma “demonstração junto dos investidores de dívida pública, estrangeiros e nacionais, da continuação dos esforços necessários para estabilização e posterior redução do stock” dessa dívida. Reforçar os sinais positivos da estrutura produtiva, aproveitar o potencial de crescimento da economia portuguesa, integrada na economia global, definir de forma correta os incentivos e as escolhas para aplicação do novo quadro comunitário de apoio e aumentar a produção interna e a exportação de bens e serviços com maior valor acrescentado são outros dos grandes desafios.

 

Mudanças europeias precisam-se

Mas nem só de política interna deve viver o período pós-troika. Integrado na União Europeia e, em especial, na zona euro, Portugal deve bater-se por conseguir que a nível europeu as políticas sejam definidas de forma a ajudar o seu ajustamento. Catroga aponta desde logo a concretização tão rápida quanto possível da união bancária como um dos vetores essenciais a nível europeu, bem como uma postura mais ativa do BCE em relação às chamadas medidas não convencionais de política monetária e uma maior vontade de implementação do Programa de Compra de Obrigações de Dívida Soberana. A retoma económica a que se tem assistido a nível global é outra matéria que esteve em análise na intervenção que Eduardo Catroga fez recentemente no American Club. Embora reconheça que essa retoma “está a acontecer”, salienta que riscos geopolíticos como a crise na Crimeia, sinais de desaceleração e de alteração do modelo de crescimento da China e indicadores mistos nos EUA e na zona euro “têm posto alguma água na fervura”. A fraqueza do crescimento do investimento empresarial nos EUA, na zona euro e no Japão, a fraca aceleração do comércio mundial, o facto de o volume do crédito não descolar, a inflação antecipada continuar a diminuir ou o preço das matérias-primas teimar em não recuperar são algumas das caraterísticas que Catroga aponta como “bizarras” e que estão a influenciar o vigor da retoma.

Ajuda ao “motor alemão”_EDG9197_PAG 15

Estará a zona euro no bom caminho? O ex-ministro do PSD considera que ainda subsistem alguns riscos e que, para que o crescimento fosse mais vigoroso, seria importante que economias como França ou Itália dessem uma ajuda ao chamado “motor alemão”. Para Portugal não existem soluções fáceis mesmo no contexto europeu. As medidas de ajustamento conduziram, inevitavelmente, a uma contração da procura interna, à redução da capacidade de produção e a um aumento do desemprego. O colapso do consumo privado e do investimento foram consequências naturais em todos os países periféricos da zona euro. A forma como o PAEF foi desenhado também não ajudou, na opinião do economista. É certo que ele “corrigiu lacunas de um PEC IV irrealista”, mas de forma “insuficiente”: definiu um ritmo de develerage do sistema bancário muito acelerado, não cobriu as necessidades de financiamento do setor empresarial do Estado, partiu de bases incorretas ao nível da dívida ou da despesa, subestimou os impactos do ajustamento económico e financeiro na atividade económica e ignorou os incentivos fiscais e financeiros ao investimento produtivo, na opinião do homem que elaborou parte do programa eleitoral do PSD.

Fragilidades condicionam próximos orçamentos

A “exaustão fiscal” e o elevado nível de desemprego a que Portugal chegou foram, na sua opinião, consequência também deste programa mal desenhado. Findo o programa, e agora? Catroga lembra que chegámos a 2013 numa situação em que já esgotámos as receitas extraordinárias e as receitas das privatizações e em que ainda existe um gap significativo entre o total possível de receitas recorrentes no Estado, e o total de 81 mil milhões de euros de despesa pública estimada para 2013. “Uma realidade incontornável que irá condicionar os próximos orçamentos do Estado, qualquer que seja o Governo.”