CARLOS ZORRINHO

MÁRIO SOARES UM EXEMPLO DE CORAGEM

Cumpriu-se, no passado dia 7 de janeiro, um ano sobre a morte daquele que constitui para mim a maior referência da democracia portuguesa e uma das maiores referências da democracia à escala europeia e mundial. Soares foi objeto de muitas homenagens em vida, as maiores das quais foram as que resultaram da concretização prática da sua visão e do seu sonho de liberdade, justiça social, desenvolvimento e convivência pacífica entre os povos. A comoção provocada pela sua morte, em Portugal e fora dele, foi um testemunho claro da grandeza e da elevação de uma vida que ficou gravada nos anais da liberdade e da cidadania. O reconhecimento do grande combatente pela liberdade, pela democracia e pela concretização do ideal europeu levou o Parlamento Europeu a atribuir o seu nome a uma das principais salas de reuniões situadas no seu edifício principal, em Bruxelas. Um edifício onde outro português já desaparecido, grande defensor do ideal europeu, Francisco Lucas Pires, tem o seu nome atribuído à sala de leitura da Biblioteca. Foram muitas as palavras escritas e ditas sobre Mário Soares, democrata e cidadão ativo, protagonista do seu tempo e cujo legado marca e marcará o nosso futuro coletivo. Neste texto, que é também mais uma forma de demonstrar gratidão, quero destacar a sua coragem pessoal e política. Sempre tivemos e continuamos a ter, em Portugal e na Europa, personalidades de rara inteligência, preparação e capacidade de ação. O progresso vivido nas últimas décadas, ainda que matizado pelo aprofundamento das desigualdades, é fruto da mobilização dos povos, mas também da visão e da inspiração associada aos que em cada momento assumiram a condução dos governos e a concretização das políticas. Num olhar para o percurso de vida extraordinário de Mário Soares, identifico muitas qualidades e circunstâncias em que soube fazer a diferença. A coragem esteve sempre associada a essas ocasiões. A coragem de decidir. A coragem de arriscar. A coragem de ir contra a corrente e não escolher o caminho mais fácil. Foi assim quando ainda no tempo da ditadura fundou o Partido Socialista e criou uma plataforma determinante para a conquista da democracia em 1974 e para a sua preservação nos anos seguintes. Foi assim também quando em 1977 pediu a adesão de Portugal à então CEE, iniciando um ciclo único de progresso e desenvolvimento que ainda hoje prossegue. Foi assim finalmente, quando contrariando todas as sondagens decidiu em 1985 concorrer à Presidência da República, foi eleito e exerceu um duplo mandato de enorme qualidade, elevação e dignidade. Foram muitos os momentos em que a coragem de Mário Soares, associada à sua preparação pessoal e política, fez a diferença na sua vida e sobretudo na vida de Portugal. Os exemplos referidos atestam uma marca perene. Soares foi e será para sempre o exemplo de um grande democrata, de um homem de Estado, de um português ilustre, de um europeu de referência e de um homem de coragem.